quinta-feira, 16 de setembro de 2010

As picuinhas musicais dos Jovens/Velhos chapecoenses (Part.I)


.....Na madrugada anterior a esta, fui convidado por outros três amigos músicos de uma banda chamada Elefante Branco, para sair. Eu que há algum tempo tenho me entrincheirado no meu estúdio (que serve tanto para tocar /estudar guitarra, como ler livros, no silêncio das madrugadas) resolvi, sabendo que a cidade estava deserta às 01:00hrs , aceitar o convite. Após passar por um dos bares assiduamente freqüentado pelos jovens roqueiros da cidade e manifestar meu protesto em relação a sentar naquele bar, fomos para outro lugar (Gosto de uma pizzaria na via gastronômica, pois ainda não descobriram ela...)– a fim de preenchê-lo com boa conversa-, para o bem de minha/nossa saúde mental.
.....No outro lugar onde nos alojamos com mais conforto e com a possibilidade de uma conversa (como um grande amigo meu sempre diz: O silêncio também é música – eu interpreto assim, nessa ocasião, “momentos de silêncio em uma conversa são musicais para os meus ouvidos”), um desses meus amigos ficou incomodado pelo fato de estar tocando sertanejo na rádio sintonizada. Disse eu que, naquele momento, isso não me incomodava. Ao que, me retrucou, citando um de meus últimos textos no blog. Foi aí que, pensando sobre isso, senti a necessidade de me fazer entender melhor quando falo de música no blog. Rememorando alguns trechos dessa importante conversa, vou apresentar agora, na seqüência, minha ideia (saibam que opinião é uma coisa que pouco me interessa, ideias são um pouco mais desenvolvidas...) em relação à problemática da música em Chapecó.
.....->deixo claro que este texto não é uma resposta aos referidos amigos que sabem quem são. São apenas ideias que achei interessantes elucidar a fim de que pensemos mais sobre isso... (Também vale dizer que é assim que acredito que se faz filosofia).
.....Em primeiro lugar, para se pensar algo como o fato de alguns milhares de jovens atualmente se deslocarem para clubes em Chapecó para ouvir um gênero chamado sertanejo universitário, é preciso ter um mínimo de senso histórico. Ou seja, dito de um modo mais claro, isso que denominam enquanto música sertaneja é o resultado de uma história da música no Brasil e influenciada pela música no mundo (isso é óbvio, mas o óbvio também precisa ser dito!). A maioria dos historiadores que leio, dizem que há uma crise do senso histórico (uns chamam de senso histórico, outros de constituição histórica crítica do sujeito, enfim, usaremos senso histórico nesse texto). Se essa é a questão sou partidário do “sim”, pois tenho visto pessoas que não conseguem se quer lembrar-se do que aconteceu em maio de 1968 – eu não estava lá, óbvio, mas é engraçado como os livros nos ajudam, parece até bruxaria...- Para refrescar o senso histórico de alguns vou apresentar uma série de fatores que devem ser relevados, ou melhor, há um rastro histórico deste gênero musical no Brasil que deve ser observado com atenção.
.....Anterior a existência de um estilo gravado (registrado em discos, gravado em estúdios) havia por volta de 1920 uma forma de se compor músicas no interior de São Paulo, um sentimento captado que se referia a uma oposição urbano-interior. Eram chamadas, de forma genérica, “modas”. Perdurava enquanto forma, nessas músicas, dueto de um instrumento denominado “viola”, e a concepção “vocal” em duetos. A característica no cantar era uma voz tenor (mais aguda) e uso acentuado de um falsete (grosso modo, forçar a voz em um tom mais agudo – falsete do italiano falsetto: tom falso; remete a um tom falso em relação à voz do cantor – mais grosso modo ainda: canta de forma não natural a sua voz comum – Isso é marca registrada no rock...). A característica dessas composições seria: Música romântica, voz triste com o objetivo de comover, porém, manifestação de dança alegre. No gênero deste mesmo, denominado caipira, poderia se notar uma saudade da terra (saídos do interior rumo à cidade), a oposição que comentei linhas acima que consistia em um engano em relação à crença de que a vida na cidade seria mais confortável. Em 1930 começaram a aparecer às primeiras músicas desse gênero gravadas em disco e difundidas como música caipira/ modas de viola; lembrem-se da famosa “viola caipira”. O salto mais relevante para chegarmos a uma, digamos, base do sertanejo universitário se daria em 1980 com a adição de outros instrumentos musicais e a mudança de uma ótica dita moralista (que eu chamaria de ressentimento do homem do campo vindo para cidade), para uma visão romântica (aqui o romântico é deturpado, romântico não mais relativo ao sentimento angustiante apaixonado, apenas referindo-se a mulher/homem) e este foi o primeiro gênero destinado as massas criado no Brasil. Passando assim, o antecessor sertanejo (sertanejo refere-se a um outro lugar geográfico, o morador do sertão, Norte/ Nordeste) a ser catalogado como “sertanejo de raiz”. Aqui, me parece que esse gênero começou a se dividir em subgêneros, a música sertaneja produzida no pós-segunda guerra. A primeira seria dita a música sertaneja autêntica do homem rural autêntico, a segunda uma forma de música “ligada à indústria cultural” (Não esqueçam esse termo, será fundamental nesse texto posteriormente), destinada por sua vez as massas. Poderíamos chamar também de sertanejo urbano. Este segundo recebe influências de ritmos do Norte e interior do Nordeste como o xaxado e baião. Nota: Sertanejo é referente ao sertão – Norte/Nordeste, Caipira ou “moda (de viola)”, relativo ao interior de São Paulo, Minas Gerais, etc...
.....Aqui faremos uma pausa para um pouco de reflexão. Até agora, o que apresentei foi concepções históricas que dão base para esse gênero denominado sertanejo universitário. Ainda não chegamos ao que realmente consiste esse tal gênero e adianto aqui que chegar a uma concepção do que consiste esse tal gênero, requer de antemão, uma contemplação que ainda não existe... Estou dizendo que precisarei fazer grandes saltos ao analisar esse gênero, no mais, para esse texto não ficar muito chato e aparentemente um mero catalogador de estilos, levantarei algumas questões. A primeira consiste no seguinte: Raul Santos Seixas (que todos que falam em rock no Brasil conhecem por Raul Seixas) tinha enquanto uma de suas propostas (digo uma, pois, para esse músico o que não faltaram foram propostas...) demonstrar o quanto o rock era similar ao baião. Citarei como exemplo o que Raul fez no VII Festival Internacional Da canção (FIC) de 1972, quando se classificou com duas canções, a de meu interesse nesse texto é “Let me sing, let me sing” (A outra canção seria “Eu sou eu e Nicori é o diabo”). Prestem atenção nisso: O rock que (na minha concepção, e acredito ser acompanhado por mais alguns...) origina-se de uma relação entre o “Folk” e o “Blues”, estilos rurais americanos, possuí no seu cerne possíveis analogias com o sertanejo raiz e romântico brasileiro. Mas aí poderiam me dizer: Mas Raul apresentou analogias entre o Baião e o Rock e não entre o sertanejo e o rock. Caso levantem essa hipótese eu lhes direi: BINGO! Falaremos disso à seguir. A primeira questão que lhes coloco é a seguinte: Vejo entre os jovens apreciadores ou músicos de rock uma negação direta ao sertanejo. Para mim não pensar que esses jovens não passam de revoltados ignorantes gostaria que revelassem à que tipo de gênero de sertanejo estão se opondo. Pois vejam bem, se o quesito for habilidade, vejo em alguns tocadores de viola caipira habilidades que superam em técnica alguns virtuosos guitarristas de metal (e todos os seus gêneros – e falo do gênero metal pois são famosos [ obviamente para eles mesmos] por se vangloriarem de técnicas complexas) –certamente não cairei aqui na contradição de opor os instrumentos (guitarra e viola), pois são coisas distintas mesmo que há um princípio similar na execução. Estou me referindo em habilidades de cada músico em seu respectivo instrumento. Se o outro quesito em jogo for erudição teórica musical, devo lembrar-lhes que muitos dos grandes músicos, literatos, filósofos, historiadores, etc, se tornaram grandes ao transgredirem as normas usuais de seus paradigmas (modelos) teóricos (erudição). Mas se por fim, a oposição se basear no quesito proposição (proposta) enquanto letra de música ,pasmem com o que vou escrever-lhes agora, Ozzy Osborne diz no inicio da canção Paranoid (composição: Iommi, Butler, Ward, Ozzy): “Finished with my woman 'cause she couldn't help me with my mind, People think I'm insane because I am frowning all the time”, traduzo de cabeça: “Terminei com minha mulher pois ela não podia me ajudar com minha mente, pessoas pensam que sou insano pois estou olhando com ira o tempo todo”. Ao que Raul, imaginemos hipotéticamente, responde no palco para platéia do FIC: “Não vim aqui tratar dos seus problemas, o seu messias ainda não chegou. Eu vim rever a moça de Ipanema e vim dizer que o sonho, o sonho terminou”. Não sentem uma intíma vontade de rir? Eu sim. Enquanto o monstro consagrado pelos roqueiros de plantão faz um chororô em relação a sua mulher, um outro músico embalado no baião responde “não vim aqui tratar dos seus problemas...”. No entanto, o que me parece mais dingo de risos é quando alguém começa a me dizer o quanto os rocks (os tais rocks) são superiores e se defrontam com uma preposição bem humorada da minha parte, como essa que acabei de apresentar, logo me respondem: Ah, mas cada um “curte o que bem quiser... e se diverte como quiser”. Mas vejam, se cada um curte o que bem quiser, embasados em que os roqueiros discutem tanto com os que gostam de sertanejo – e os menosprezam ou inferiorizam (e vice versa)? Ora, se no fim das contas a preposição é sempre generalizante? Meus amigos, a estes eu digo: Querem realmente desenvolver uma discussão digna nesse campo ou querem só ficar alugando meus ouvidos com lamentações e preconceitos estúpidos? Ainda dando espaço para algumas reflexões nessa pausa na linha de constituição histórica do sertanejo no Brasil (e expecificamente nessa cidade), recordo-me de uma ocasião no movimento /projeto Entrevero de Rock (o qual faço parte, com menor participação direta do que outrora, por motivos intímos de crença no movimento), onde se apresentou uma máxima que se dizia bem humorada, inclusive usada em algumas apresentações de bandas envolvidas, que dizia o seguinte: “Se o sertanejo é universitário o rock é Phd”. Phd, para os que não sabem, é um título de pós-doutorado, que na brincadeira da frase, pressupõe uma hierarquia superior de títulos, ou seja, um Phd possúi qualificações academicas superiores a um universitário comum. Naquele momento, admito, ri dessa piada. Hoje acho que as coisas são mais sérias. Denegrir outros não é a melhor opção de superação (imagino que o que esta em jogo na arte é a superação de si e não dos outros, imagino também que superar os outros é impossível na arte, sendo a arte a manifestação subjetiva do artista). As piadinhas são engraçadas, mas quando você faz um cartaz com uma piada e toca com ele pendurado nas suas costas, imagino que isso é muito mais sério. Se alguém acha que estou exagerando, faz os seguinte, pendura uma suástica nazista no palco e diz: é brincadeirinha! – Se o punk fez isso, como imagino que alguns devem estar pensando agora, fez por dois motivos: Provocar estéticamente nojo e não deixar que as pessoas esquecessem a barbárie que o humano já foi capaz de produzir – Há os que fizeram por ingorância,em relação a esses eu dispenso comentários nesse texto.
.....Agora, notei que o texto se tornou demasiado extenso – mas o tema é delicado, deveras-, então farei o seguinte, dividirei esse texto em duas partes. Logo postarei a segunda. Por hora, ficamos por aqui. No texto seguinte definirei três momentos do que se constitui o gênero sertanejo e por fim minha crítica. Fique bem claro, não gosto deste gênero musical e vou apresentar-lhes meus motivos, mas em suma, demonstro que não faço meras balbucias em relação a esse tema.

Continua...

r.A.

5 comentários:

fabita . disse...

http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=98159112

Rodrigo disse...

Aguardando ansiosamente a sequencia...

Suetam Thceps disse...

(aplausos)

Animais terrestres disse...

Hehehe
O Mateus agora é Suetam...
Gostei.

herman ou niko disse...

puzé!
em relação a frase (se o sertanejo é universitário, o rock é phd),criada ou copiada de alguém pelo Winston (plug e play), fomos nós Epopeia quem tocou na noite, junto com outra banda.. há de se contextualizar.. no período aquilo fazia mais sentido.. era a época onde a mídia estava projetando o tal 'estilo'.. e a proposta da frase estar no local era pra isso mesmo.. tirar onda! universitário ou phd.. tudo uma grande piada! tudo rótulo.. já que mercadoria se vende.. óka?! que tudo fique mais claro para não cair no discurso (cabe um Foucault aí).. no mas.. adelante!