sábado, 25 de setembro de 2010

Manual para jovens escritores...


.....Escrever, aparentemente, não requer muita coisa. A prova que não sou um bom escritor provavelmente reside nessa primeira frase! Só escrevo em estado de tragédia – tal como só consigo compor canções assim... -, dando-me conta que alguma coisa esta rompida em algum canto obscuro da minha psique. Contos, músicas, poemas, canções, crônicas, são ferramentas enquanto metodologia. O que realmente se passa por trás do domínio destas metodologias é lamacento. Assimilar que alguém pode morrer ou viver fazendo isso é mera tautologia, mera lógica discursiva. Uma mulher atravessa a rua e é atropelada por um ônibus, isso não é tornar-se um escritor, de forma alguma, mas ninguém diz: atravessar a rua era a vida daquela mulher – ou a morte (talvez um escritor narre à história dessa forma). Narrar é uma luta contra o tédio (inclusive?). Toda a magia com que adornam o “ser” de um escritor é uma brincadeira de mau gosto. Sei que Cioran disse isso, e outros milhões de escritores copiaram isso dele, inclusive eu agora, mas de fato, em todos os prólogos e orelhas de livros está escrito: Um dos maiores escritores de todos os tempos! Quando leio isso eu fico imaginando o quanto tediante era o cotidiano desse tal sujeito para escrever tanto ao ponto de ser dito dele que ele era um dos maiores. Eu, por exemplo, mesmo sendo duvidoso usar-me como exemplo, escrevo para manipular o tédio. Talvez outra forma de sufocar isso é a televisão, o trabalho (com toda a sua carga estúpida e moral), os filhos, as namoradas (os), os amigos (as), um bar ou uma igreja. Notem que para alguém escrever um bom poema ou uma boa história não pode estar lá fora vivendo uma boa história. Não é por acaso que os professores (eu dou aulas, mas professor NUNCA!) discutem que os jovens tem lido pouco. Quando saio e vejo um bando de desajustados vagando por aí – não é difícil encontrá-los, se você for até a janela vera algum, certamente -, penso ser uma pena eles não encontrar o que saíram para procurar. Um bom escritor se empolga com uma formiga e escreve horas sobre a formiga. Um bom poeta escreve sobre as folhas no chão, sobre o vento e a chuva, sobre a bebida, sobre o mar, etc... Eu, vejam, disse que eu não era bom, não dou a mínima para essas coisas todas. Me cansam pessoas suaves, prosas com lantejoulas, carnavais na escrita. Inclusive não sou um músico embutido de erudição musical, logo que me canso em estudar música. Talvez meu enorme gosto pela filosofia seja guiado pela empatia para com outros entediados como eu. Que, certamente, diferente da maioria intensa de bilhões de habitantes desse mundo, algumas filosofias fazem mais sentido para mim do que a natureza é inegável para comigo mesmo. O curioso é que tenho como companheiros os atravessados na filosofia, os avessos! Ao que Medina Reyes escreve no prefácio de um livro de poesias que “a poesia não impede uma guerra nem cura gripe, mas ajuda a suportá-las”, eu digo que a filosofia impede guerras e inclusive ajuda a suportá-las. Ambas ajudam com uma “loira peituda” – do citado prefácio -, porém, a filosofia me ajudou a manter-se afastado delas (por algum tempo – me guiou para as morenas). Fazendo livres associações eu imagino que já tenham percebido que eu sou mais filósofo do que um escritor – já disse que não sou bom???
..... Escrevo e mantenho o presente blog – e até o divulgo- unicamente para compartilhar com vocês essa minha brincadeira, onde quanto mais os convido para brincar comigo, mais sei que se aparecessem me estendendo à mão eu recusaria. Notem que as primeiras postagens são as mais interessantes – a meu ver- porém são aquelas que ninguém olha. Depois eu comecei a tratar de questões que eram próprias para todos e as pessoas começaram a visitar-me (visitar minhas palavras, aquilo que estranho em mim mesmo, inclusive agora)! Hoje descobri que há um lugar para se consultar as visualizações e ri quando vi que mais de novecentas (900) pessoas visitaram esse blog no último mês. Porém, ainda assim, os textos menos acessados são os mais importantes – ainda a meu ver. O que viola minha rabugentice, justamente pelo fator que já sabia e comprovo, o que faz de um texto (um escritor, um filósofo, um músico) um texto é o quanto os outros acham ele relevante. Isso tudo é estranho, pois, se escrevi sobre coisas que as pessoas acharam interessante ler, foi um acaso (em relação ao esforço). E mesmo assim tem pessoas que se ofendem ou encontram grande sentido para seus dia-a-dia nisso. Quando alguém fica bravo ou me acusa de ser destrutivo e obscuro (patológico) eu não me enfureço e nem faço grande esforço para me justificar. Sei que o que as pessoas veem em geral é o que doe nelas admitirem. A acusação de escrever na escuridão eu aceito até como lisonja, sendo que, é esse meu lugar habitual há muito tempo – certamente antes da escrita.
..... O que eu diria para jovens escritores (e diria para mim mesmo) é apenas para escreverem se lá fora esta chato demais. Diria isso para jovens músicos também. É uma forma de brincar, de se conhecer, de conhecer as outras pessoas. Mas não chorem por falta de reconhecimento ou se alguém criticar suas escritas... Nada se torna pessoal quanto tudo é pessoal, o nada é tudo usando uma máscara! Se desejam fazer objeções a tudo que esta aí (como eu faço e admito fazer) façam isso se perguntando se é necessário três vezes. Se for, ninguém mais é capaz de dizer o contrário. Quando disserem, escrevam mais. Agora se choram, considerem fazer outra coisa. É possível rir tropeçando em uma pedra e chorar descascando cebolas. Eu gostaria de ter me dito isso à alguns anos atrás – mas nunca é tarde quando é tarde demais!

r.A. – Aos que encontrarem esse texto perdido no blog.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Outra Maravilhosa Capa de disco da Dupla citada no texto abaixo (esses deixaram saudade (?)

As picuinhas musicais dos Jovens/Velhos chapecoenses... (Part II)


Nota: Será longo, mas será prazeroso... Prometo.

.....No texto anterior eu parei no pós segunda guerra (no que diz respeito ao sertanejo), pois bem, no pós segunda guerra (meados de 1960) ouvimos pela primeira vez a guitarra elétrica aparecendo neste estilo. Os autores da façanha, até onde se tem notícias, é a dupla Léo Canhoto e Robertinho (as lindas figuras da foto). Agora faço uma pausa para lhes dizer como é que sei disso tudo que falei no texto anterior (e sigo falando neste): Minha mãe é uma dos últimos de uma geração (desta região) de “gaiteiros”, ou melhor, tocadores de acordeom. Nesse meio então, eu tive acesso a algumas centenas de discos e outras centenas de histórias sobre as canções. Meu avô faleceu há alguns anos e deixou um dos acordeons mais caros e raros enquanto lembrança da família Webert do Nascimento (italianos com caboclos). Sobre meu avô, a história mais engraçada que já ouvi foi um “causo” sempre lembrado na reunião de músicos da família, consistia, resumindo, que um dos seus antepassados (e meu, óbvio!) morreu de um enfarte e foi enterrado com um acordeom (a muito ele dizia que era seu desejo). Algumas pessoas sabendo o valor que esse instrumento possuí violaram o seu túmulo a fim de pegar o acordeom, ao que, o defunto levantou e começou a tocar o acordeom! Quando ouvi essa história eu ri e disse: Mas que mentira fajuta! E ele riu de volta e disse: O coração dele deve ter voltado a bater e graças aos ladrões de túmulo ele não morreu “novamente” asfixiado embaixo da terra. Estou lhes contanto isso para deixar em maior evidência que cresci ouvindo esse estilo de música. Aliás, até me recordo de zanzar em torno de minha mãe, com menos de quatro anos de idade, enquanto ela dava aulas ou simplesmente tocava para pessoas que queriam conhecer o estilo desses “gaiteiros caboclos”, um estilo que era mais que tocar música, eram pessoas que viviam a música que tocavam. Infelizmente para mim, a forma de execução deste instrumento não é uma forma que respeita uma estrutura precisa, teórica, da música como é ensinada hoje... Eles apreendiam com o “sentir”, como dizia meu avô (estou falando desse estilo de tocar, não de tocar acordeom, precisamente). Disse infelizmente e disse, pois eu, por mais que tentasse compreender esse estilo, não consegui aprender! Um dos músicos que conheciam esse estilo era José Mendes... Músico do estilo gauchesco – outra história longa...-, pois bem, voltamos ao Leo Canhoto e Robertinho. Para vocês terem uma ideia do quanto era semelhante ao rock esse primeiro estilo onde se introduziu a guitarra, até hoje, quando me recordo de um dos discos (que se perderam), não sei onde termina o sertanejo e onde começa o rock. Em dois dos discos dessas duas figuras, a poética é simples e divertida! Eles contam histórias semelhantes ao velho oeste. Para terem mais uma idéia, o nome de uma das canções é “Delegado Jaracuçu” (nome do disco que me referi). É uma narrativa que lembra as histórias contadas pelos bluesmen do Mississipi. Fala sobre dois amigos que “bebiam cachaça dia e noite em um tonel”, terminavam por discutir e se encher de tiros – na canção há colagens de sons de tiros. A estrutura da canção vai do blues ao folk – sertanejos, meus amigos... Sertanejos! No final da narrativa/canção, o delegado os obriga a ir para o alto de uma montanha e matarem um ao outro – o que eles fazem com prazer (o nome das duas figuras que se matam é “Urutu Cruzeiro” e “Cascavel”- [risos])! As pessoas quando encontram o corpo de ambos “furados de bala igual tábua de pirulito” começam a rir de uma forma meio maluca – as risadas estão incluídas na música. Em outra canção de outro disco (que não me recordo no nome do disco, mas a canção é “Motoqueiro apaixonado”) que possuí arranjos de violino e é tocada no estilo mariachi, ouvimos um refrão novo no que diz respeito a esse gênero de Sertanejo (Sertanejo moderno): “Você não presta, mas eu te amo, como eu te amo, o seu amor meu bem, faz bem para mim!” Lembra vocês de alguma música do aclamado sertanejo universitário? – Talvez todas! E é rock do sertão meus amigos, anterior ao movimento chamado jovem guarda! Mas pasmem amigos roqueiros de plantão: eles é que eram os avessos da música nessa época! Eles é que estavam andando na contramão do convencional! Me desculpe o Roberto e o Tremendão, mas esses dois pistoleiros chegaram na frente naquilo que é mais singular ao rock (contra cultural). Outras influências que se encontra nesses dois é a polca paraguaia e a guarânia, inclusive a rancheira mexicana! O que mesmo a gente encontra no rock nos anos 60? Blues, folk, música indiana... (Bossa nova, no caso dos Doors e blues cigano). Ainda há uma frase fantástica em outra canção dessa dupla, não consigo não achar divertido quando ouço: “Não pare esse baile gaitêro, se não é hoje que você vai deitar na fumaça!” Violento? Sim é, mas isso é completamente a oposição do flower Power dos hippies. Aliás, para não dizerem que eu não falei de flores, em uma outra canção dessa dupla de pistoleiros os instrumentos param de tocar repentinamente e um deles perguntam para uma mulher: “Você gosta de flores mulher?” E se ouve uma voz feminina e meiga que responde: “Adoro flores!”. Aí vem um “Bang “(de um revólver) acompanhado de um: “no seu velório vai estar cheio de flores!” Ao perguntar para minha mãe se ouviam esses caras e gostavam, ela respondeu: Claro que não! Era terminantemente proibido ouvir esses “cabeludos”! (mais risos). ”Isso era música de vagabundo sem futuro!” – Alguma semelhança ao que ouvimos de nossos pais em relação ao rock? Sinceramente, penso que ouvir rock é mais “educativo”, mas vejam, achamos os malditos do sertanejo! E põe maldito nisso! Se um roqueiro se atrever a gravar essas coisas hoje em dia, prontamente será perseguido. Nem o trash dos trashs metals mandam tão bem na maldição como esses caras! Outra canção : “se prepara bodegueiro, lá vai o braço!” – e tem gente que me fala de Matanza ainda... Se vocês me perguntarem se eles fizeram sucesso eu temo ter de responder que sim! Mas vamos seguir depois dos malditos para concluir o texto.
..... Como todos sabem, o grande boom do sertanejo foi os anos oitenta. Não preciso nem descrever o que aconteceu: Tinha mercado e gravadoras desesperadas procurando um produto para massificar! Os punks fizeram alguma algazarra, mas como mostra Gastão Moreira no documentário “Botinada”, uma campanha da rede globo (sempre ela...) aniquilou o levante – e óbvio, a imagem do rock e todos os seus gêneros não foi facilmente desvinculada a esse movimento! Muitos foram os que eram partidários do rock que perderam seus empregos, que foram perseguidos socialmente, mesmo não tendo nada a ver com o gênero punk. Ao mesmo tempo (80-90) surgiram os nomes que vocês ouvem todos os domingos: Chitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e Luciano, Leandro (finado) e Leonardo, Cristian e Ralf (que tentaram ser artistas solo no rock, mas foram convertidos da noite para o dia (?) para o sertanejo) , Gian e Giovani, João Paulo e Daniel, Batman e Robin (opa, esses são dos anos 50-60) e outros cuja a existência não fora comprovada ainda (risos), Alan e Aladin (um dos dois morreu extraindo um dente...), Chico Rey e Paraná, Roberta e Miranda (alguns dizem que era uma só, mas tenho lá minhas dúvidas), e por aí vai... Lembrei do Sergio Reis, mas ele é dos anos 70, mas aparece entre esses aí também nos anos oitenta e noventa. Para os que gostam de teorias conspiratórias, sinto desagradá-los, mas verdade seja dita, mesmo que o gênero sertanejo nunca tenha sido censurado pela ditadura militar (embora houvesse sim músicas de crítica política ao sistema vigente entre 64 e 85), os sertanejos não eram bem aceitos nos programas de t.v. e rádios. Eram tidos como iletrados e chulas – embora, como constatei antes, eles absorveram muitas vertentes de vários estilos e formas de se fazer música-, e assim, imagino que o primeiro programa de grande audiência sobre música sertaneja e em t.v. aberta veio no fim da ditadura militar (1986 –sbt). Portanto, arrisco afirmar que as acusações de um gênero musical que não cultua críticas políticas ser responsável do descaso político (nunca confundam quando eu digo política com partidarismos, com politicagem...) no país é um pouco de extremismo.
.....Para encerrar esse assunto, vou dizer-lhes o que percebi ser o sertanejo universitário: O resultado de uma história de um gênero musical que agora bebe na fonte da indústria cultural (o rock bebe da mesma fonte, podem acreditar) – ou seja -, simula ao mesmo tempo que é um estágio da cultura, melhor dito, ao mesmo tempo que simula ser um movimento cultural contemporâneo é um movimento – uma figura para pensarem: um cara que esta desesperadamente afim de uma mulher e simula estar a fim de outra forma (com um pouco de descaso) para forçá-la a mostrar suas intenções – nessa jogada, ela faz o mesmo (Stigler, filósofo contemporâneo, diz que a industrialização é um estágio da cultura e cultura sempre foi controle, então, juntamos a fome a vontade de comer...) . Acredito também ser o retrato mais fiel da atual forma de pensar niilista (modo de pensar niilista é uma contradição, pois pensar é sempre sobre algo e niilismo seria “nada”, ou seja, é uma forma de pensar em nada – vejam: como disse, em texto anterior no blog, “sair de casa para não pensar em nada, entreter-se”-, não me recorre aqui algo diferente de um círculo onde os extremos se tocam) tão bem difundida no Brasil – e no mundo. Para retratar da melhor forma possível, nada mais denunciador desse movimento do que uma letra que impulsiona o ouvinte a trair o parceiro (a), justificada na traição respectiva do parceiro – ao mesmo tempo em que gostaria de não ter sido traído e nem se sente vingado traindo. E se ainda não me fiz entender, vou apresentar a vocês o trecho que retirei do Wikipédia ao pesquisar Sertanejo universitário para encerrar o presente texto (vão lá e vejam com seus próprios olhos): “Por surgir após o segundo movimento sertanejo (o Sertanejo Romântico), esse estilo já não conta com letras tão regionais e situações vividas por caipiras (como o Sertanejo Raiz). Geralmente as músicas tratam de assuntos do Sertanejo Romântico da forma como os jovens veem (assuntos como sair com várias mulheres e traição)”.

“Como os jovens veem...” – Pensem nisso! Será que o rock não esta fazendo a mesma coisa?

r.A. –Agradeço aos membros da banda Elefante Branco por me provocarem as palavras! E a todos que leram esses dois textos gigantes.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Palhaços escravos em uma fábrica de robôs (Ou o artista enquanto gesto - Conceito de Agamben)

Nota: 1- Gostaria que lessem esse texto antes de lerem a segunda parte de “As picuinhas musicais dos jovens/velhos chapecoenses”- Acredito que o texto se fará mais compreensível nos seus pontos nodais. 2- Eu espero que esse texto seja curto (risos). 3- Não pude deixar de escrever esse texto, tomem ele como uma resposta a mim mesmo para minhas lamentações presentes no texto “Todos meus conhecidos tem sido campeões em tudo...” que esta nos textos do mês de setembro no presente blog. 4- Se possível, gostaria que lessem esse texto escutando (se não tiverem, coloquem tocar no youtube) a canção “Dumb”, do Nirvana. Recomendo também, a leitura da tradução da letra (caso a compreensão do inglês não for suficiente). 5- Chega de ladainha, né?

.....Então eu estava escorado na parede de um barracão abandonado, às 22:00hrs, próximo ao ponto de ônibus urbano da rua da academia Sport Center, academia essa que a uns dez anos eu iniciei meu treinamento em judô – Agora é só um lugar para se bombar o corpo a fim de sentir menos vergonha dele (embora a vergonha do corpo seja apenas mais uma das ideias fincadas na nossa cabeça pela grande mídia da causa da boa –pseudo- saúde). O que eu fazia lá? Fumava um cigarro, pensava, esperava a lotação com moedas contadas no bolso a fim de voltar para casa. Sobre o que eu pensava? Pensava sobre a arte, em específico sobre a música. Eu estava escorado em um portão de lata todo destruído. No chão havia dois sacos de lixos esparramados – um do meu lado direito e outro do meu lado esquerdo- (estava contracenando com a paisagem), no ponto da lotação, escorados, estavam alguns jovens e duas senhoras. Um dos jovens usava tênis allstar puído, jeans e uma flanela. Ele tropeçou e os outros riram. Eu ri também (foi aí que eu o notei). Aquela roupa, do tipo que eu usava no ensino médio... Estilo grunge. Uma moda acessível! Aquilo chegou até ali, Setembro de 2010, uma cidadezinha provinciana do interior tentando fazer pose de grande cidade. E eu, uma hora esperando o maldito ônibus Urbano. Uma saveiro passou vagarosamente, com o som extremamente alto, completamente distorcido – imaginei dentro do carro-, os garotos sentados no ponto de ônibus riram, ouvi alguém dizer: mas que babaca... E mais risos. Eu com umas moedas enroladas em um papel – que rasguei de um convite para uma apresentação de rock em um bar- a fim de não esparramá-las. Fumando o último cigarro de uma carteira que meu ex-professor de filosofia sentiu de me dar. Cinco reais e vinte e cinco centavos no bolso da mochila em frangalhos. Eu, vinte e três anos. Se você me perguntar alguma coisa sobre Nietzsche eu sei te responder! Se você quiser saber sobre o teatro grego, sobre as divindades gregas, especificamente sobre Dioniso (ou Dionísio, ou Baco), teremos assunto para uma noite. Se você me perguntar sobre a história da música, falaremos por alguns dias. Se me perguntar sobre Kurt Cobain ou Jim Morrison, creio que falaremos por um mês... Agora se você perguntar sobre mim... Haverá um longo silêncio – há silêncio agora enquanto escrevo sobre mim. A rua escura e suja, folhas de jornal bailando com o vento. E eu li no jornal um cara dizer que as pessoas saem de casa para se divertir, ouvir músicas que eles já conheciam, que não havia sentido fazer música própria... Eu ri. Quando deixaremos de ser presunçosos e estipular o que as pessoas querem ou não querem ouvir? Como é que você pode dizer que as pessoas querem ouvir música que já conhecem se você nem apresenta para elas coisas novas, novas preposições, novas possibilidades, novas formas de encarar sentimentos, novas angústias e novos sorrisos? Uma senhora arcada passou por mim puxando uma mala na mão direita (com rodinhas que emperravam por causa da sujeira das ruas) e com uma sacola na mão esquerda. Um olhar triste e desconfiado para mim. Seriam meus magníficos 110 kg distribuídos em 1,85 M. ou talvez meus cabelos espessos e revoltos no vento. Minha vestimenta negra da ponta do pé até o último fio de cabelo. Minha barba por fazer, ou melhor, ainda, seriam meus olhos vermelhos como sangue (a minha amada ceratocone que tanto amo... Que tanto arde nos meus olhos...)? Se eu fosse jornalista eu perguntaria: E aí meu amigo, essa senhora sofrida saiu para se divertir? Talvez ela esteja esperando uma música do The doors toda esculhambada... Ah, me poupe! “As pessoas querem...” O que é que nós temos na cabeça quando dizemos isso e proferimos uma sentença? Minhocas? O mais engraçado é que você pode substituir as reticências por aquilo que o cara que profere a frase esta fazendo. O que é que eu tenho a ver com o que as pessoas querem? Virei uma mercadoria? Não sou mais um ser humano? Não faço mais uso da arte para criar uma nova comunhão? Agora eu vou dizer para as pessoas (olhei para os garotos no ponto de ônibus): VOCÊS QUEREM O QUE EU TENHO AQUI PARA VOCÊS MEUS AMORES, VOCÊS SÃO LINDOS, MAS QUE LINDOS QUE VOCÊS SÃO!!! Tirei mais uma baforada do cigarro e ri no meu silêncio. Quanta falcatrua eu vejo por aí! Quanta tolice! Quando os artistas contemporâneos começaram a dizer que lata de sopa era obra de arte – nada novo para os índios navajos ou os que já habitavam aqui no Brasil (no sentido da comoção) – aparentemente faltou para alguns aspiras a artistas lerem o resto de todo o trecho... “Desde que esse elemento seja uma síntese e carregue todo o sangue do seu coração”. Se eu fizesse música para convencer os outros a ouvir estaria ferrado! Alguém poderia estar rindo agora e dizer: Também, com as músicas que você faz... uma droga! Eu replicaria: Faça uma você também! Experimenta cara! É outra coisa, consegue me entender? Quer uma analogia? Vou parir uma para você: Imagine que você quer transar com a sua namorada, mas você não sabe se ela vai gostar (se excitar) de ver você pelado, aí você chama o ex-namorado dela, porque ele você tem certeza que ela vai querer – ora, ela já quis... Provável que vá querer novamente! HAHAHAHA – Não é mais ou menos isso, ou eu extrapolei agora? Faz assim, de vagarinho você mostra a bunda – e o ex lá-, ai você mostra um pouco da barriga – e o ex lá -, você mostra aos pouquinhos – e o ex rindo da sua cara e lá...- Acaba o show e o ex gozou e agora é você que esta lá, escondido, encolhido, porque não tinha certeza se ela queria ou não ver você nu. Mas e o que sei eu? Vinte e três anos e cinco reais e vinte cinto centavos enrolados em um pedaço de papel para não perder as moedas. “Eu não sou como eles, mas posso fingir” acabei de ouvir Kurt recitar. Não estou com o som ligado, sabem, mas ele recitou aqui na minha cabeça. Nenhum de vocês vai poder chegar perto disso, nem vocês e nem eu! Isso era dele – continua sendo dele- e ele se foi, não é mesmo? Mas estamos vendo aqui em Chapecó (e região) uma carência de criatividade, de fazer parte da grande tradição cultural – que extravasa com a cultura - que é a arte, por isso o recurso mais usado é a reprodução. Presenciei um cara dizer para mim: O Black Sabbath tocava uma hora de Black sabbath, nós tocamos três horas de Black sabbath, entende?, nós tocamos mais do que o Black sabbath. AHAHAHAHAHA... Eu teria coragem para expor quem disse isso, mas não vou fazer pelo único e grande motivo que isso me causa pena! E se me causa pena eu acho covardia expor ele. Como é que essa gente embarca nessa? Eu me perguntei. A minha hipótese é simples: Os artistas tinham tradicionalmente o papel de apresentar suas obras para uma sociedade – mas não faziam isso pela sociedade em si, faziam a fim de renovar a cultura aniquilando a cultura estabelecida (Não confundam isso com atos anarquistas, são atos políticos sim! Mas não filiados a um tipo especifico de política) – mas como essa forma de fazer arte (ou melhor: A FORMA DE FAZER ARTE) caducou com os simuladores de arte – gente que simula ser artista!- plagiando os artistas estamos, agora, dando voltas. Vejam bem, aí caímos nesse círculo vicioso: Os simuladores de artistas ficam plagiando os artistas e os artistas se retiram de cena e restam apenas esses simuladores (pseudo-artistas). Eu queria ver os covers de Black sabbath plagiar o Ozzy agora, velho, enrugado, falando um monte de besteira- HAHAHA-, desculpem a ironia, é força do hábito. Se restam só simuladores a cultura não se renova, ela fica patinando, estagnada, e os problemas das mudanças dessa cultura perduram (pois a cultura não muda e assim não caem por terra antigos moralismos). Tem quem ache que isso não é grave, mas eu sou dos que acham que isso é grave! Chegamos à democracia neoliberal, e aqui, tudo é válido, todos podem fazer o que bem quiserem. Se um cara subir no palco e disser no microfone: Aí galera, quero que todos vocês vão se foder! É, se foder, vão tomar no cu! Eu não sei mais se vão aplaudir e rir, achar aquilo bacana ou se vão vaiar. Vejam, nos bailes funks brasileiro, os caras chamam as mulheres de cadelas e elas gostam (?), inclusive se vocês não se lembram eu os faço relembrar, um programa da tarde dominical insistiu por seis meses em mostrar caras falando essas coisas para mulheres e a câmera fazia um mergulho por baixo da saia de bailarinas para mostrar o mais próximo possível da vagina delas – Uma amiga psicóloga me contou ontem que isso continua a acontecer. Pergunto: Isso tudo tem ou não tem a ver com o que se tem feito enquanto arte nos últimos tempos? De fato, outra amiga, em uma boate, certa vez foi dizer para o segurança que um cara estava tocando nela. Ele respondeu: Você poderia não ter vindo de saia... E riu. Ora, o que é que esta mais correto: as mulheres usarem uma armadilha pega-urso (aquelas dos desenhos do pica-pau) por baixo da saia ou ensinar os homens a respeitar as mulheres? Me atrevo a chamar para uma discussão qualquer artista (e não artista) que disser que arte não tem um dever político/cultural e é apenas expressão. Na última bienal que fui, em Porto Alegre, assisti o registro de uma performance que consistia em um homem introduzindo a bandeira do Brasil no ânus (?). Em primeiro lugar, não me chocou, em segundo não me causou nenhum tipo de sentimento e nem se quer me fez pensar em algo... Foi somente aquilo – e estava lá, na bienal de Porto Alegre-, enquanto estava sentado em um banco na frente do Masp (que descobri que era uma obra) eu via ônibus saídos de Chapecó (da escola de arte, da unochapecó) trazendo jovens pretensos artistas para verem aquilo. Eu pensei: É isso a arte hoje? É para isso que estamos rumando? Alguém poderá me repreender dizendo: Sim, mas não causou nada em você, poderá causar em outras pessoas! Aí, eu responderia: Na boa, esquece um pouco os manuais de arte contemporânea que lhe socam guela abaixo. Estes possuem mais fugas para a arte do que proposições! Na referida bienal eu ouvi um registro poético de 1986 onde o artista dizia: “O que interessa na arte não é arte...” (o nome da obra é “interesere”). Hoje, quando lembro dessa frase eu ainda sinto um calafrio. Mas e agora, vocês acham que ser artista é ficar reproduzindo essa frase? Eu nem se quer sabia se queria ou não ouvir isso que ouvi... Mas ouvi. E olha que saí de casa para me divertir - hahahaha. Se vocês puderem assistir o documentário do Gastão Moreira “Botinada”, a história do punk no Brasil, verão uma coisa muito interessante; embora os músicos que acham que instrução musical é tudo digam: a vá, os punks eram uns analfabetos musicais! Os punks diziam somente o seguinte: Nós queríamos fazer a música que queríamos fazer e não tinha na época. Não queríamos ficar estudando música dez anos se com o que tínhamos já conseguíamos fazer e nos expressar suficientemente! Podia ser uma merda de uma barulheira, mas eles criaram aquilo... Vejo que o mais sujo e iletrado dos punks já colocam 90% do que esta sendo feito hoje em Chapecó no bolso. Quando alguém fala em Dionísio eu começo a rir, pois a criação artística provém de Apolo, os dionisíacos não criavam, não encenavam, eles viviam e se despedaçavam nessa vivência. Eu li em uma entrevista um cara falar que usava elementos dionisíacos na sua música... Eu ri muito disso! Nem se quer sobreviveria se usasse um pingo de elementos dionisíacos no palco! Nem Jim Morrison era dionisíaco – como adoram falar, um grande jargão clichê-, ele tentava manipular elementos dionisíacos – isso é a tragédia grega, mas a tragédia grega é apolínea, não dionisíaca. O que sugiro? Sugiro aos artistas lerem um pouco mais a respeito do que realmente estão fazendo e não ficar procurando frases de efeito para dar entrevistas – sugiro isso aos jornalistas também.
.....Giorgio Agamben no seu livro “Profanações”, parafraseando Michel Foucault, diz algo que vou traduzir mais ou menos assim: O que interessa saber se Albert King (Blues) usava cueca de seda ou calcinha fio dental? Isso não muda o seu blues! O artista, você compreende no gesto de sua arte e não na sua história individual! O que me interessa se Nietzsche tinha bigode, se Rimbaud era homossexual, ou se Van Gogh tinha um dente de ouro? Isso muda o que eles criaram? Na academia – falo agora da filosofia que estou cursando – filósofos marxistas não leem Heideggar porque ele foi Nazista... Que atraso isso significa para um filósofo! Mal posso expressar! Tem gente que não lê Kant porque Cioran impossibilitou à metafísica... Que grosseria! Difícil entender essas últimas frases, não é? E já pensou se eu digo que vocês são todos uns idiotas por não compreenderem isso? Hahahaha! Certamente eu seria mais idiota ainda! A diferença esta no seguinte: Eu me propus a fazer filosofia, então eu entendo de filosofia! O que eu espero é que quem se propôs a fazer arte entenda do que esta falando e fazendo! Ninguém desconstrói nada sem entender como a coisa é construída – grande aprendizado que tive de pintores abstratos! Portanto meus amigos, plagiadores, simuladores, são plagiadores e simuladores, não artistas! “Contenham as lágrimas”...
.....E eis que o ônibus aparece. Entulhado! Eu deixo que ele passe dessa vez... Decido esperar o próximo – cruzando os dedos para que apareça um próximo, afinal, eu saí para me divertir – quero aquilo que é previsível, não quero ser surpreendido!- (Risos). Mentira, eu decidi não pegar esse ônibus logo que vi que recuperei as palavras (encontrei as pessoas). Uma noite eu me debrucei na janela do meu quarto e olhei para a cidade. Vi que no céu se tapavam os horizontes tetos de fábricas. Conceituei fábricas e cheguei nas pessoas... Que gesto veio depois disso... Que gesto!

r.A. Ironicamente digo: Não negue o seio quando chegar a sua vez!

=> Agora vamos a continuação das picuinhas...

sábado, 18 de setembro de 2010

Vim apé, volto a pé,
O estrageiro sem economia vai partir.
E a criança sem bonecas vai partir.
A magia de meu exílio será rompida esta noite.
E a mesa que estava vazia será arrumada.
No sofrimento, vaguei por entre os horizontes.
Sou quem as pessoas viram vagando.
O que não tenho, colocarei no lugar que deixarei.
Vim a pé, volto a pé.

(Poema registrado pelo cineasta iraniano: Mohsen Makhmalbaf _ Recitado por um Afegão que estava sendo deportado do Irã)

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

As picuinhas musicais dos Jovens/Velhos chapecoenses (Part.I)


.....Na madrugada anterior a esta, fui convidado por outros três amigos músicos de uma banda chamada Elefante Branco, para sair. Eu que há algum tempo tenho me entrincheirado no meu estúdio (que serve tanto para tocar /estudar guitarra, como ler livros, no silêncio das madrugadas) resolvi, sabendo que a cidade estava deserta às 01:00hrs , aceitar o convite. Após passar por um dos bares assiduamente freqüentado pelos jovens roqueiros da cidade e manifestar meu protesto em relação a sentar naquele bar, fomos para outro lugar (Gosto de uma pizzaria na via gastronômica, pois ainda não descobriram ela...)– a fim de preenchê-lo com boa conversa-, para o bem de minha/nossa saúde mental.
.....No outro lugar onde nos alojamos com mais conforto e com a possibilidade de uma conversa (como um grande amigo meu sempre diz: O silêncio também é música – eu interpreto assim, nessa ocasião, “momentos de silêncio em uma conversa são musicais para os meus ouvidos”), um desses meus amigos ficou incomodado pelo fato de estar tocando sertanejo na rádio sintonizada. Disse eu que, naquele momento, isso não me incomodava. Ao que, me retrucou, citando um de meus últimos textos no blog. Foi aí que, pensando sobre isso, senti a necessidade de me fazer entender melhor quando falo de música no blog. Rememorando alguns trechos dessa importante conversa, vou apresentar agora, na seqüência, minha ideia (saibam que opinião é uma coisa que pouco me interessa, ideias são um pouco mais desenvolvidas...) em relação à problemática da música em Chapecó.
.....->deixo claro que este texto não é uma resposta aos referidos amigos que sabem quem são. São apenas ideias que achei interessantes elucidar a fim de que pensemos mais sobre isso... (Também vale dizer que é assim que acredito que se faz filosofia).
.....Em primeiro lugar, para se pensar algo como o fato de alguns milhares de jovens atualmente se deslocarem para clubes em Chapecó para ouvir um gênero chamado sertanejo universitário, é preciso ter um mínimo de senso histórico. Ou seja, dito de um modo mais claro, isso que denominam enquanto música sertaneja é o resultado de uma história da música no Brasil e influenciada pela música no mundo (isso é óbvio, mas o óbvio também precisa ser dito!). A maioria dos historiadores que leio, dizem que há uma crise do senso histórico (uns chamam de senso histórico, outros de constituição histórica crítica do sujeito, enfim, usaremos senso histórico nesse texto). Se essa é a questão sou partidário do “sim”, pois tenho visto pessoas que não conseguem se quer lembrar-se do que aconteceu em maio de 1968 – eu não estava lá, óbvio, mas é engraçado como os livros nos ajudam, parece até bruxaria...- Para refrescar o senso histórico de alguns vou apresentar uma série de fatores que devem ser relevados, ou melhor, há um rastro histórico deste gênero musical no Brasil que deve ser observado com atenção.
.....Anterior a existência de um estilo gravado (registrado em discos, gravado em estúdios) havia por volta de 1920 uma forma de se compor músicas no interior de São Paulo, um sentimento captado que se referia a uma oposição urbano-interior. Eram chamadas, de forma genérica, “modas”. Perdurava enquanto forma, nessas músicas, dueto de um instrumento denominado “viola”, e a concepção “vocal” em duetos. A característica no cantar era uma voz tenor (mais aguda) e uso acentuado de um falsete (grosso modo, forçar a voz em um tom mais agudo – falsete do italiano falsetto: tom falso; remete a um tom falso em relação à voz do cantor – mais grosso modo ainda: canta de forma não natural a sua voz comum – Isso é marca registrada no rock...). A característica dessas composições seria: Música romântica, voz triste com o objetivo de comover, porém, manifestação de dança alegre. No gênero deste mesmo, denominado caipira, poderia se notar uma saudade da terra (saídos do interior rumo à cidade), a oposição que comentei linhas acima que consistia em um engano em relação à crença de que a vida na cidade seria mais confortável. Em 1930 começaram a aparecer às primeiras músicas desse gênero gravadas em disco e difundidas como música caipira/ modas de viola; lembrem-se da famosa “viola caipira”. O salto mais relevante para chegarmos a uma, digamos, base do sertanejo universitário se daria em 1980 com a adição de outros instrumentos musicais e a mudança de uma ótica dita moralista (que eu chamaria de ressentimento do homem do campo vindo para cidade), para uma visão romântica (aqui o romântico é deturpado, romântico não mais relativo ao sentimento angustiante apaixonado, apenas referindo-se a mulher/homem) e este foi o primeiro gênero destinado as massas criado no Brasil. Passando assim, o antecessor sertanejo (sertanejo refere-se a um outro lugar geográfico, o morador do sertão, Norte/ Nordeste) a ser catalogado como “sertanejo de raiz”. Aqui, me parece que esse gênero começou a se dividir em subgêneros, a música sertaneja produzida no pós-segunda guerra. A primeira seria dita a música sertaneja autêntica do homem rural autêntico, a segunda uma forma de música “ligada à indústria cultural” (Não esqueçam esse termo, será fundamental nesse texto posteriormente), destinada por sua vez as massas. Poderíamos chamar também de sertanejo urbano. Este segundo recebe influências de ritmos do Norte e interior do Nordeste como o xaxado e baião. Nota: Sertanejo é referente ao sertão – Norte/Nordeste, Caipira ou “moda (de viola)”, relativo ao interior de São Paulo, Minas Gerais, etc...
.....Aqui faremos uma pausa para um pouco de reflexão. Até agora, o que apresentei foi concepções históricas que dão base para esse gênero denominado sertanejo universitário. Ainda não chegamos ao que realmente consiste esse tal gênero e adianto aqui que chegar a uma concepção do que consiste esse tal gênero, requer de antemão, uma contemplação que ainda não existe... Estou dizendo que precisarei fazer grandes saltos ao analisar esse gênero, no mais, para esse texto não ficar muito chato e aparentemente um mero catalogador de estilos, levantarei algumas questões. A primeira consiste no seguinte: Raul Santos Seixas (que todos que falam em rock no Brasil conhecem por Raul Seixas) tinha enquanto uma de suas propostas (digo uma, pois, para esse músico o que não faltaram foram propostas...) demonstrar o quanto o rock era similar ao baião. Citarei como exemplo o que Raul fez no VII Festival Internacional Da canção (FIC) de 1972, quando se classificou com duas canções, a de meu interesse nesse texto é “Let me sing, let me sing” (A outra canção seria “Eu sou eu e Nicori é o diabo”). Prestem atenção nisso: O rock que (na minha concepção, e acredito ser acompanhado por mais alguns...) origina-se de uma relação entre o “Folk” e o “Blues”, estilos rurais americanos, possuí no seu cerne possíveis analogias com o sertanejo raiz e romântico brasileiro. Mas aí poderiam me dizer: Mas Raul apresentou analogias entre o Baião e o Rock e não entre o sertanejo e o rock. Caso levantem essa hipótese eu lhes direi: BINGO! Falaremos disso à seguir. A primeira questão que lhes coloco é a seguinte: Vejo entre os jovens apreciadores ou músicos de rock uma negação direta ao sertanejo. Para mim não pensar que esses jovens não passam de revoltados ignorantes gostaria que revelassem à que tipo de gênero de sertanejo estão se opondo. Pois vejam bem, se o quesito for habilidade, vejo em alguns tocadores de viola caipira habilidades que superam em técnica alguns virtuosos guitarristas de metal (e todos os seus gêneros – e falo do gênero metal pois são famosos [ obviamente para eles mesmos] por se vangloriarem de técnicas complexas) –certamente não cairei aqui na contradição de opor os instrumentos (guitarra e viola), pois são coisas distintas mesmo que há um princípio similar na execução. Estou me referindo em habilidades de cada músico em seu respectivo instrumento. Se o outro quesito em jogo for erudição teórica musical, devo lembrar-lhes que muitos dos grandes músicos, literatos, filósofos, historiadores, etc, se tornaram grandes ao transgredirem as normas usuais de seus paradigmas (modelos) teóricos (erudição). Mas se por fim, a oposição se basear no quesito proposição (proposta) enquanto letra de música ,pasmem com o que vou escrever-lhes agora, Ozzy Osborne diz no inicio da canção Paranoid (composição: Iommi, Butler, Ward, Ozzy): “Finished with my woman 'cause she couldn't help me with my mind, People think I'm insane because I am frowning all the time”, traduzo de cabeça: “Terminei com minha mulher pois ela não podia me ajudar com minha mente, pessoas pensam que sou insano pois estou olhando com ira o tempo todo”. Ao que Raul, imaginemos hipotéticamente, responde no palco para platéia do FIC: “Não vim aqui tratar dos seus problemas, o seu messias ainda não chegou. Eu vim rever a moça de Ipanema e vim dizer que o sonho, o sonho terminou”. Não sentem uma intíma vontade de rir? Eu sim. Enquanto o monstro consagrado pelos roqueiros de plantão faz um chororô em relação a sua mulher, um outro músico embalado no baião responde “não vim aqui tratar dos seus problemas...”. No entanto, o que me parece mais dingo de risos é quando alguém começa a me dizer o quanto os rocks (os tais rocks) são superiores e se defrontam com uma preposição bem humorada da minha parte, como essa que acabei de apresentar, logo me respondem: Ah, mas cada um “curte o que bem quiser... e se diverte como quiser”. Mas vejam, se cada um curte o que bem quiser, embasados em que os roqueiros discutem tanto com os que gostam de sertanejo – e os menosprezam ou inferiorizam (e vice versa)? Ora, se no fim das contas a preposição é sempre generalizante? Meus amigos, a estes eu digo: Querem realmente desenvolver uma discussão digna nesse campo ou querem só ficar alugando meus ouvidos com lamentações e preconceitos estúpidos? Ainda dando espaço para algumas reflexões nessa pausa na linha de constituição histórica do sertanejo no Brasil (e expecificamente nessa cidade), recordo-me de uma ocasião no movimento /projeto Entrevero de Rock (o qual faço parte, com menor participação direta do que outrora, por motivos intímos de crença no movimento), onde se apresentou uma máxima que se dizia bem humorada, inclusive usada em algumas apresentações de bandas envolvidas, que dizia o seguinte: “Se o sertanejo é universitário o rock é Phd”. Phd, para os que não sabem, é um título de pós-doutorado, que na brincadeira da frase, pressupõe uma hierarquia superior de títulos, ou seja, um Phd possúi qualificações academicas superiores a um universitário comum. Naquele momento, admito, ri dessa piada. Hoje acho que as coisas são mais sérias. Denegrir outros não é a melhor opção de superação (imagino que o que esta em jogo na arte é a superação de si e não dos outros, imagino também que superar os outros é impossível na arte, sendo a arte a manifestação subjetiva do artista). As piadinhas são engraçadas, mas quando você faz um cartaz com uma piada e toca com ele pendurado nas suas costas, imagino que isso é muito mais sério. Se alguém acha que estou exagerando, faz os seguinte, pendura uma suástica nazista no palco e diz: é brincadeirinha! – Se o punk fez isso, como imagino que alguns devem estar pensando agora, fez por dois motivos: Provocar estéticamente nojo e não deixar que as pessoas esquecessem a barbárie que o humano já foi capaz de produzir – Há os que fizeram por ingorância,em relação a esses eu dispenso comentários nesse texto.
.....Agora, notei que o texto se tornou demasiado extenso – mas o tema é delicado, deveras-, então farei o seguinte, dividirei esse texto em duas partes. Logo postarei a segunda. Por hora, ficamos por aqui. No texto seguinte definirei três momentos do que se constitui o gênero sertanejo e por fim minha crítica. Fique bem claro, não gosto deste gênero musical e vou apresentar-lhes meus motivos, mas em suma, demonstro que não faço meras balbucias em relação a esse tema.

Continua...

r.A.

domingo, 12 de setembro de 2010

Eu sou no poema que escapa das algemas em pleno tribunal
Salto pela janela deslizando nos gritos de protesto do juiz
E grudo no céu da boca
E me esparramo na calçada

Me embalo no ronco de fome
Na barriga do mendigo
No penúltimo gole de vinho
Na ponta da chave da porta do motel.

Quando me quiserem será sempre muito tarde
Se for não, eu estreito os olhos
Evito com sucesso todas as mamães
No entanto, mostro os dentes para os cães

Venha me visitar de vez em quanto...
Mas não fique demais
Sou feito de ganchos
E pulo de cabeça no abismo

Eu sou no escape, no sorriso de fingimento sincero.
Canto sem esperanças na fronteira
Uma letra mal impressa na bula do seu remédio
Violento âncoras em madrugadas de domingo, por diversão

r.A.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

"Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo..."


.....Não sinto mais tanta vontade de escrever. O que houve? De alguma forma, sinto em algum lugar fora de mim – aquilo que se perde são palavras - , que perdi as pessoas e versa & vice. Por algumas horas pensei em Fernando Pessoa. Estava frio essa manhã e eu andava com uns poemas de Pessoa no bolso traseiro da calça jeans. As pessoas saiam correndo, perdendo o ônibus, algumas esquecendo alguma coisa, perdendo sempre : Mas que bando de perdedores! Por alguns instantes tive uma frase de efeito incrível, sabem, daquelas que imortalizam um poeta... Era mais ou menos assim (infelizmente eu esqueci a frase inteira – fodido como poeta e jebus riu lá do alto): Hã... eu aceitaria perder a vida, desde que não perdesse as palavras & o contrário sempre será válido! (Aplausos frenéticos da multidão até sangrar a palma das mãos e deslocar os pulsos).
.....Todo dia alguém vem me contar que fez alguma coisa muito boa. Sorte deles! E eu continuo procurando alguém para fazer alguma coisa boa por mim. Eu bem sei que deveria me misturar mais, conversar, olhar as pessoas nos olhos, dizer: Cara, gostei muito de uma coisa lá que você fez ______ <= Espaço para ser preenchido com alguma coisa. Mas eu tenho uma trava para falar essas coisas. Aliás, eu tenho uma trava! Eu me daria bem se eu conseguisse fazer isso. Por uma eterna e apocalíptica meia hora eu pensei sobre isso: r.A. entra em uma padaria. Senhor padeiro, eu devo admitir, gosto muito de como você diz para mim todas as manhãs “bom dia” acompanhado de um “no que posso ser-lhe útil?” Eu conheci algumas mulheres nessa minha curta vida que acordavam comigo na cama e só me pediam a hora ou diziam que precisavam ir embora. O padeiro, lisonjeado me dizia muito obrigado, você é muito gentil. Vou fazer o seguinte... tenho notado que o Sr. tem fumado demais e comprado muita cerveja. Vou lhe dar um saco de pães. Esta olhando aquela cuca ali? Ok, leve-a também. Por conta da casa. Ah, ia me esquecendo. Leve também esse dinheiro, quinhentos reais não me fará falta. Pague a mensalidade na universidade, você tem um glorioso futuro pela frente! E nós apertávamos as mãos com firmeza e empatia. Pensávamos que naquele momento conhecemos pessoas de bem. Quando eu saia, a mulher do padeiro apareceria pela cortina que separa o balcão da cozinha, com um daqueles chapéus, com luvas de plástico nas mãos e questionava ele sobre o cara manco que acabara de sair. O padeiro enxugava as lágrimas na manga da camisa e diria que lá se foi um grande poeta e filósofo.
.....Antes de voltar a pensar na diferença que consiste entre mim e Fernando Pessoa, o segundo certamente escrevia e o primeiro não, senti que o grande segredo da vida era ser gentil. Que pena... Algumas pessoas matam sorrindo, traem cantando, cagam pensando em flores, e acham que Chê Guevara foi um herói.
.....Cansado, sentei no canto de uma lanchonete para ler os poemas que trazia comigo. Pelo menos alguém que tinha vontade de escrever. Li “Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?” Retirei um cigarro do bolso. A garçonete magra, sorrindo, apontou para uma placa de proibido fumar. Cantarolei um blues e tomei meu café. Quando voltei para casa, refletindo sobre minha pouca vontade de escrever, passei pela padaria. Acenei para o padeiro e ele fingiu que não viu. Sujeitinho esperto aquele.

r.A.