Não
suportamos mais pensar.
Eis a máxima mais evidente atualmente.
Pensar dói e é difícil. Se dói e é difícil, melhor é desviar esse caminho –
essa necessidade humana. Pensar cobra seriedade e tempo. Mas seriedade e tempo,
hoje, são tidos por adversários. Há quem diga que somos pós-modernos. Quanto a
mim, desconfio que somos a sociedade do pós-Nada.
Uma vez que vivemos a ditadura da
felicidade a todo custo, da excitação sem lágrimas, pensar é a coisa mais
estranha a se fazer. E o único modelo de felicidade que conhecemos é o do
comercial. “Não pense, apenas divirta-se”. Tal é o mandamento. Pedagogos e
demagogos tentaram conciliar o Pensar com o Lúdico. Não deu, pelo simples
motivo que pensar dói. Não dá para se divertir pensando – na maioria das vezes.
O riso após o pensamento é um riso melancólico. Irônico. Não chega a ser uma
gargalhada forçada. No pensamento o gozo é outro.
Lógica das reformas curriculares no Brasil: Se
pensar é difícil, então vamos substituir o pensamento por outra coisa! Qualquer
coisa lúdica há de nos livrar das crises! A maquiagem é essa: “temos de tornar
a reflexão agradável” – Não seria invés de “agradável” um “Degradável”?
Ludicidade, ocupação e futuro. Queremos
o futuro ocupado e sorridente. Pensar, não. No máximo engajamento em ideologias
cuja origem não está em nós. Religião, Trabalho e Política. Ocupadíssimos: Da
casa para o trabalho, do trabalho para o templo. Sorrir durante o percurso.
Pensar, no ápice de seu vigor de
exercício, é uma ação solitária. É aí que dói mais – se não bastasse à dor de
pensar e sua dificuldade, o pensamento cobra uma aprendizagem: Aprender a
suportar-se. Mas! Não queremos nos suportar, queremos qualquer coisa que nos
livre de nós mesmos. E para os que ainda teimam em querer pensar, temos uma
frase pronta:_ Tai o doido, andando sozinho nessas horas!
Tempo. Mas um tempo que nos prometa
algo – A única coisa que o tempo não faz é promessas. Só desejamos um tempo com
o qual possamos preencher nosso “pós-nada”, não desejamos um tempo que nos
torture com sua passagem que espedaça essa carcaça orgânica que nos habituamos
a chamar de corpo.
Não queremos mais pensar: vai que
pensando nos daremos conta que nosso pós-nada escorrega em direção ao pó? Aí o
futuro fica nu diante de nós. O futuro também é nada.
_Mas
não somos seres históricos?
_Somos.
E a história é nossa mentira favorita!
Pensar é mais difícil do que morrer. E
pode ou não ocorrer em vida. No andar da carruagem – ou melhor, no despedaçar
da carruagem – não queremos mais que esse afeto e essa dor penetrem na vida. (Quem
só entende Pensar entrelaçado com Razão, não foi avisado que antes da Lógica
vem a Ideia – Platão sabia disso!).
Pensar
é uma expressão de liberdade e nada no mundo nos angustia mais do que a
liberdade (diziam os existencialistas). Nós nos tornamos os animais que mais
procuram alguma coisa para obedecer – um Deus, um Trabalho, um Partido; em
suma, uma Utopia.
E como nos consolamos? Essa é fácil de
responder: No auto engano da participação da construção desse dogma. Quanta
ingenuidade!
_Pensar
é uma ameaça de assassinato ao dogma.
“A economia está em crise” – eis o axioma.
Dele decorrem premissas: Temos de nos unir, sociedade, para estabilizar a
economia. E das premissas decorrem conclusões: Trabalharemos juntos para
superar a crise. Se alguém tiver a ousadia de dizer: Pensarei sobre isso! A
resposta já está pronta para humilhar o engraçadinho: Pensar nada, você vai é
para um instituto técnico de período integral para se preparar para o mercado
de trabalho e desempenhar sua performance de “cidadãozinho”. Seu destino é: Dar
orgulho para o papai, para a mamãe e para o país!
_E
pensar? Não rola?
_Pensar
não abate as metas! Quer ficar desocupado? Pensar não enche barriga e saco
vazio não para em pé.
Se pensar é mais difícil que morrer, na
sociedade pós-nada você estará livre dessa dificuldade. Antes que você acorde
já terá um objetivo sacudindo um chicote para suas costas nuas. Quando o
chicote estalar próximo ao seu ouvido, você vai chamá-lo de Consciência. E em nome
dessa tal “consciência” você perseguirá todos, passando à diante sua condição
miserável que também receberá outro nome: Dignidade. Entretanto, veja pelo lado
bom, você terá um funeral Digno... Pois é.
_Desse
tipo de dignidade eu só quero uma coisa: DISTÂNCIA!
O que eu não te contei é que se pensar
dói, essa dor não significa de forma alguma que pensar é triste. E se fosse
triste, eu, particularmente, preferiria essa tristeza com perfume de liberdade,
mil vezes, do que essa felicidade comercial que inunda nosso pobre cérebro. Não
é para mim essa felicidade de fuga de si mesmo. Pensar me ensinou – mais que
qualquer mestre, mais que qualquer sociedade – ao invés de fugir, duelar com
forças que me impedem de ser livre. Eu mesmo sou uma força que briga sorrindo.
E me divirto ao exibir minha potência. Não é qualquer um que bate como eu bato –
daí que reconheço minha singularidade.
O crepúsculo do pensamento crítico é
como chamo nosso contexto. Agora, exatamente nesse momento em que você está
lendo esse texto, a preguiça e a covardia de muitos instauram dispositivos de
poder para banir de uma vez por todas o pensamento e em seu lugar garantir o
segundo passo para uma cultura fraca, a saber, instaurar um direcionamento
técnico e objetivo para uma mentalidade que só vê sentido no imperativo
econômico – “econômico” segundo o axioma que expus acima.
_Falou
em economia então a coisa é séria!
Pensar não é sério, economia é!
(risos).
Se você não sabe o nome desse
dispositivo de poder, vou te ensinar a chamar os problemas pelo devido nome. A
tal “Reforma na educação” – que vem sido encarada enquanto “solução”- é nada
mais do que uma tentativa de sufocar o tempo de pensar pelo tempo de Ocupar-se:
Obviamente na engrenagem de um tipo estratégico de economia – há quem pense que
superar crises tem a ver com dar empregos; essa estratégia não me engana! Já que
aceitamos que pensar é difícil – e pouco lúdico – agora a sociedade no geral
está demonstrando seus sintomas de fracasso.
_Pensar
pra que? Temos é que agir!
_Quando
essa pergunta é feita, seguida dessa afirmação vazia, em uma sociedade, você já
pode se preparar para o pior!
[Os
nazistas não sabiam pensar, só sabiam obedecer – e obedecer em nome de redenções
econômicas!]
Não suportamos mais pensar, porque nos
tornamos uma sociedade de bundas moles! Um tipo de bunda mole que vive de
lamentação e contorna todas as pedras pelo caminho. O tipo de molengas que
adoram pegar atalhos em momentos de crise. Confundimos nossa dramalheira com
sensibilidade. A prova do quanto nos idiotizamos é que não reconhecemos mais o
pensar como uma ação, o pensar como uma atitude mais rápida é devastadora que
qualquer prática – o pensar como objetivo imediato.
No fundo o que nossa atual política quer
fazer é nos ensinar a “brincar de trabalhar em nome de promessas utópicas de
futuro”. Pessoas podem te fazer promessas (ainda mais em época de eleição...),
mas o tempo não mente por conveniência, colega –Há um abismo que separa
História e Tempo.
É lindo falar em Inclusão – mas,
deixe-me te perguntar de maneira ousada: você é amigo ou inimigo de quem quer
incluir numa lógica patética dessas? Como? Você também foi enganado com a
conversa de “brincar trabalhando”? Não duvido! Nem um pouco.
Viu como eu te conduzi até aqui para te
mostrar que sei desmascarar o tal lúdico? Por trás de uma palhaçada sempre tem
uma intenção descansando na sombra. É esse tipo de intenção que eu piso no
pescoço quando pratico filosofia! E você ia morrer pensando que filosofia é só
pensar, né? – filosofia é deitar as ideias na porrada! Se ligue.
Bem, só posso terminar esse texto com
uma pergunta que é ao mesmo tempo uma provocação:
_JÁ
PENSOU HOJE?
r.A.
“[...]As
pessoas já se envergonham do descanso; a reflexão demorada quase produz
remorso. Pensam com o relógio na mão, enquanto almoçam, tendo os olhos voltados
para os boletins da bolsa – vivem como alguém que a todo instante poderia
perder algo. Melhor fazer qualquer coisa do que nada – este princípio é também
uma corda, boa para liquidar toda cultura e gosto superior.”
_Nietzsche.
A gaia ciência.
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