sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O importante é você conseguir permanecer na cama até o meio-dia



(ao som de Black Keys – Lonely boy)

Acordei e já passava das 4. Fiquei na cama até as oito e continuo. Para quem começa o dia com indagações metafísicas enquanto encara o teto e termina sozinho de qualquer jeito; tenho durado muito. Acho que poderia ter durado bem menos – sem morrer, é claro! Com isso quero dizer que alguém como eu, com vinte e tantos anos, já deveria ter se entregado para o mundo e batido palmas para o sol feito uma foca retardada.
         Nunca entrei na conversa fiada sobre arte e cultura. E é por isso que sigo resistindo, correndo dos canibais, com o cérebro em uma mão e um machado na outra. O importante é você conseguir permanecer na cama até o meio-dia. “Qual é o seu conselho para os escritores?” – É esse, porra, fiquem na cama! “E para quem vive de arte e cultura?” – Que tomem no cu. “É esse o conselho?” – É, isso mesmo. Mas que tomem no cu não num sentido teatral. Tomem no cu em silêncio, no fundo de um café adornado de livros e discos de alta relevância cultural. Essas coisas que jogam com a náusea, saca? O vômito de várias gerações, regurgitando sem ser engolido... Que tristeza!
         Ainda esses dias vi um grande professor de literatura falando que montou um grupo para recitar poesia para as vacas no potreiro. Putz! Imagino o sono das vacas e a depressão. Tem bicho que paga caro pelo brejo ser raso. Cadê aquele pessoal que luta contra o sofrimento dos animais? Pois bem, lá estava ele com sua careca reluzente e bem polida – sinal de um cérebro em plena ordem! – chocando o coraçãozinho de jovens acadêmicas, cujo sucesso é obter uma graduação com um projeto em Clarice Lispector. O importante é não ter saúde – para mim, pelo menos.
         Já que falamos de Clarice, fico pensando se ela cuspia, engolia ou saia da frente na hora H. Tem cara de ser a última opção. Teríamos que esperar a publicação de alguma pesquisa sobre o fato – quem seria o orientador? O poeta das vacas que citei acima, desconfio que não: a pipa do vovô não sobe mais! Não sei muito sobre Clarice Lispector, vou ser franco. Mas já dei uns tapas na bunda de uma loira que sabia bastante sobre ela – e isso já conta! Não na academia, óbvio. “Marxchista”.
         Como nem só de dar tapas na bunda de loiras se vive a vida – infelizmente -, também me chamou atenção esse lance do romantismo alemão. Aqueles rabugentos que se matavam por causa de mulher e choravam olhando para flores num jardim. No fundo eles queriam mesmo era morrer por qualquer que fosse o motivo e chorar à toa. E isso parece que não foi superado pela galerinha de agora. Abri, ainda ontem, uma dessas revistas que explicam a cena literária do eixo (Rio de Janeiro/São Paulo/BH) e me saltou na cara essa geração chorona e descornada. Essa gente que tem medo de escrever Buceta num conto, sabe?, mas vivem posando de boca suja. O que vai ser daqui uns anos? Tomara que eu (ou “eles”) não dure muito...
          Abro o e-mail e alguém diz “Seu último texto é degradante e ofensivo, que Deus tenha piedade de você!”. Tai a crítica construtiva que me faltava. Antigamente se queimavam os livros, mas agora não dá para queimar os blogs. Me enrolo nas cobertas e desligo o celular. Acendo um cigarro e escrevo esse texto que você está lendo agora. É só um desabafo de alguém que perdeu o sono e não tem nada de interessante para contar.
         Não sei imitar uma foca, mas me destaco no papel de Bicho-preguiça. Veja pelo lado bom, pelo menos parei de escrever. Hoje.



r.A.


P.s. A foto que ilustra o texto não é minha, por mais incrível que pareça a semelhança. As aparências enganam – um pouco.

"A sua mamãe cuidou de ti, mas seu pai te deixou.
Eu devia ter feito o mesmo com você.
Mas acabei te amando, será que nasci para sangrar?
Nenhuma das vezes que você me deixou esperando...esperando".
_Dá música que citei no inicio do Texto.


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