terça-feira, 3 de junho de 2014

Otimismo para idiotas & pessimismo para dengosos!



......O filósofo francês Luc Ferry escreve no prefácio de seu livro "Aprender a viver" algo com o que concordo - e muito. Diz ele que para um cidadão comum é imprescindível conhecimentos básicos de história, literatura e matemática, mas é incrível que perdoamos que esses tais "comuns" não tenham um mínimo de instrução em Filosofia. Quanto a mim, penso que um sujeito que não saiba basicamente sobre Platão - no mínimo - deveria urgentemente voltar para a escola. E não sair de lá até que aprenda. (Nossa pedagogia está longe de fazer isso!).
......Já o alemão Friederich Nietzsche dizia na sua obra "A filosofia na era trágica dos gregos" que uma cultura que se pergunta para que serve a filosofia já está em plena decadência! A filosofia se legitima na medida em que se filosofa e uma cultura que não filosofa não fez seu dever de casa. Veja só, não estou dizendo de forma alguma que deveríamos todos nos tornar filósofos - nada disso! Continuo fazendo par com o tal Luc Ferry: um mínimo de instrução. 
......Acho no mínimo risível que poucos de nós sentimos a necessidade de filosofar. Digo risível porque acho ridículo. E sem filosofar, pelo que tenho visto, temos ampliado bastante nosso deserto da estupidez. 
......Somos cotidianamente bombardeados por máximas tanto do otimismo para idiotas quanto do pessimismo para dengosos. Bem, se essas máximas circulam livremente ausente de qualquer crítica o sintoma é óbvio: Se por um lado perdoamos que não se tenha um mínimo de instrução filosófica, por outro lado aceitamos qualquer baboseira 'bonitinha' que não passa do raso. Penso que uma coisa anularia a outra - na maioria das vezes. É possível que não levemos a vida a sério. Onde a vida é banalizada me parece que podemos esperar o pior. E por isso aceitamos que se diga qualquer coisa da vida - que se resmungue qualquer perspectiva frouxa. As consequências dessa preguiça intelectual são nítidas na cultura. Hoje uma bunda e um punhado de dinheiro se tornou o bem supremo! Nada exageradamente contra bundas e punhados de dinheiro, mas deixar essas coisas se tornar o norte de uma cultura nos torna um pouco mais medíocres. 
......Não tenho notícias de outro contexto histórico-social onde se falou tanto em superação - de 1970 pra cá. Mas quando observo mais atentamente o que é que foi superado por aqueles que falam tanto em superação me deparo com bundas lipo-aspiradas ou magrelos/magrelas que conseguiram adquirir mais carne para enfeitar os ossos e por aí segue o baile. Um amigo que dirige uma academia de ginástica e musculação disse esses dias que não aceita críticas sob suas tais superações. Aliás, dizia ele que não aceita críticas de gente gorda! (risos). Para ele e seu aguçado senso crítico os "gordos" sentem ciumes de suas superações! A mesma justificativa tenho visto para garotas cujo sentido existencial é mostrar os seios na internet. Dizem elas que tem o direito de fazer o que se sentem bem - não discordo, de forma alguma; desde que esse direito não atropele os direitos de outros em uma sociedade. Mas seguem discursando, as tais que encontraram o sentido último da vida, que qualquer crítica dirigida a elas não passa de ciume (geralmente dizem ser recalque, mas recalque é um conceito mil vezes mais complexo...).  
......Não se trata agora de apenas apontar o quanto isso é uma banalidade. Se trata de apontarmos algo que a sociologia bem transformou em objeto de estudo. Quando um sujeito "recolhe-se" à última resistência que acha possível, a saber, seu próprio corpo, é nítido que está tão frágil que não suportaria qualquer toque. E aqui o exibicionismo tosco denuncia uma ferida narcísica muito grave. A defesa do ego não é evocada gratuitamente! Essas pessoas sofrem - e por isso não param de discursar sobre sua superação. O último investimento destes, os tais otimistas, é transformar em discurso de aceitação o ápice de sua redução a forma orgânica. A luta que essas pessoas travam é a luta pelo resto de identidade que lhes sobrou. Quem agradece e incentiva tal coisa são as empresas de "saúde" e "cosméticos". 
......Nesse caso o otimismo é uma projeção de alguém que está literalmente na merda!
......Como nem só de otimismo se vive a vida, temos o pessimismo para dengosos. O Pessimismo (com P maiúsculo) enquanto sensação filosófica é pura desolação e risco fatal que muitos filósofos tentaram combater. Se pudesse rapidamente traçar um percurso histórico sobre o Pessimismo, teria que retroceder até o berço da civilização ocidental. Isso quer dizer a Grécia dos séculos XIX a.C. Lá, dada a constatação que muitas vezes a vida é sofrida e não tem sentido algum, se perguntava não só na filosofia, mas inclusive na política: A vida vale a pena ser vivida? O longo percurso entre os séculos XIX a.C. até o século III a.C. não deixou de refletir sobre essa questão. Para que a sociedade pudesse existir, para que a humanidade pudesse perdurar, era necessário combater essa falta de sentido da existência e suplantar o antídoto - ou seja: A vida vale a pena ser vivida! (basicamente substituir uma negação por uma afirmação).
......Mas uma coisa é esse Pessimismo "filosófico" e outra coisa é esse pessimismo para dengosos que aí está hoje. O pessimista dengoso é aquele que simula niilismo para ouvir uma palavra de alento - um bom conselho, um abraço e uma palavrinha de consolação. Esse hábito de ser "dengoso" (a lá Los hermanos - risos), no fundo, demanda justamente cuidados exagerados! Trata-se daquele fulano e aquela siclana que parece um poço de amargura, mas um mimo já é suficiente para converter seu mundo em um vale de girassóis. É próprio do que na sociologia se denominou "geração Y" - sobre isso não falo mais nada, se quiser saber mais trate de pesquisar ou fique aí resmungando feito um idiota (risos).
......Voltemos a Luc Ferry, só para fechar bem o texto. O nome de sua obra - que se tornou um dos livros mais vendidos em Filosofia - é extremamente sugestivo. Para Ferry o ser humano não é reduzido a um instinto natural que lhe impulsiona para uma existência determinada (como no caso da maioria dos outros animais) e nunca esta reduzido a mero acidente orgânico. Por tanto o ser humano deve aprender a viver - título da obra. E aprender a viver diz de uma ética. Por isso nosso amigo francês afirma que é imprescindível para qualquer cidadão um mínimo de instrução filosófica. A filosofia, além de uma constate elaboração e reelaboração de conceitos (por isso uma criação de saberes insubstituível em outras áreas do saber humano), é também um aprendizado de vida. Um exercício reflexivo inseparável do Éthos - reflexão sobre a moral. 
......Por isso apelo a filosofia no lugar desses otimismos para idiotas e pessimismos para dengosos. Se invés de ficarmos cuspindo máximas e se afogando no raso - como temos feito -, uma atitude bem mais estilosa e sábia, inclusive mais saudável da perspectiva de nossa vivencia em sociedade, estaria na reflexão sobre nossos conceitos. Porque convenhamos: a vida é bem mais complexa e exige muito mais rigor do que a redução a nossa ótica otimista e pessimista. O mundo cobra bem mais do que masturbação. 


r.A.

ps. Se você acha o máximo essas frases de auto-ajuda (como a da imagem que ilustra esse texto) e tem mais de 16 anos de idade, pelo seu bem, finja que não achou o máximo. 

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