quinta-feira, 29 de maio de 2014

A rua e o nada



......Embriagado de silêncio ou de música. Se não posso ir de um ponto à outro, seria melhor desistir. Ocorre que nem os suicidas desistem - são mortalmente insistentes. Quem sabe eu me acostume. Me acostumar não! Por enquanto embriagado de silêncio, se é que te importa.
......Belo não é o silêncio [ e aí se vai a tese de que "belo é o que me agrada"]. A beleza é coisa de mulheres - elas entendem disso, acredito e confio. Música também não é o caso de beleza, mas de "golpe". Se nunca tivesse sido golpeado pela música... colega, não quero nem pensar. Silêncio é conquista - mais difícil do que mulheres. Tive mais mulheres - ou elas me tiveram - do que silêncio. Se o próprio Deus surgisse na minha frente e me perguntasse:_ Ok rapaz! Silêncio ou vida eterna no paraíso? Eu responderia:_ Silêncio, por favor. E feche a porta quando sair.
_Mulheres ou paraíso?
_Até parece que o senhor não me conhece? Mulheres e não esquece da porta.
......O que move um homem (heterossexual) esperto são as mulheres. Mas o que move um homem inteligente é a beleza. Já lamentei não ser mais esperto do que inteligente. E quanto mais me dou conta de minha feiura, mais a beleza me parece a única salvação. Nem sempre a beleza e as mulheres estão associadas, mas sempre que encontrei beleza uma mulher estava por perto. Mas belo pode ser a natureza? Pode. Pode ser uma obra de arte. Talvez. "A vida é bela!" - é nada! Nem os deuses caem nesse truque. 
_Diga o que é belo!
_Dizer algo é tudo, menos belo.
......Desconfio, quando atravesso madrugadas fumando na janela de um pequeno quarto, que há duas coisas que fazem de você um ser humano. A primeira das coisas é saber que um dia vai morrer e a festa vai continuar. A segunda coisa é ter o coração arrebentado por uma paixão - e a festa também continuar. Por que essas duas coisas? Ora, porque essas coisas te revelam o absurdo da existência e a dureza do fracasso. Enlouquecer de tristeza não parece coisa de peixes, aves e mamíferos - excetuando nós. Quem diz que o amor é sempre bom não sabe merda nenhuma sobre amar. 
......Quando entendi que precisaria morrer um dia lamentei apenas todo amor que teria de abandonar. Mas ainda é um lamento "abstrato". Porém quando experimentei o estrago que uma mulher pode fazer no coração de um homem, simplesmente aprendi que o jogo todo é injusto - mas primeiro tive uns ataques engraçados: não era uma mulher, mas era um sentido que estava me abandonando [pena que essa ficha só caí tarde demais]. Eu acredito em qualquer um que digam que enlouqueceu depois disso! - definitivamente você não entende porque o outro não morre junto com você. E a maldita festa não pára! Nesse jogo nunca há empate!  O negócio é se acostumar. ME ACOSTUMAR NÃO!
......É pelo simples motivo que uma paixão que não te faz em mil pedaços não vale o risco, que Heróis e Santos saíram de moda - as mulheres sabem disso, os homens ainda não. Me refiro aos "moralistas"...
_Belo é o corpo!
_Ah, vá! Nunca é o corpo apenas que nos atraí. Caso contrário estaríamos tendo de legalizar o casamento de homens/mulheres com roliços nacos de carne no açougue! Sem a excitação da imaginação até um vibrador não passa de um pedaço de silicone. 
......Prefiro ser desejado por alguém que desejo do que viver eternamente livre da dor - minha objeção à qualquer paraíso prometido em qualquer que seja a religião, pelo menos para isso eu não fui covarde quando disse "não".  Prefiro uma confusão com uma mulher do que qualquer vidinha bem resolvida. Eu sei do que a maioria de nós vêm nos defendendo com a ilusão toda de controle (o corpo perfeito, o emprego perfeito, a ostentação perfeita - figura grandiosa do ridículo! Coisa de covardes sem um pingo de estilo). 
......Entre a rua e o nada um infinito se desdobra. E se não posso andar em linha reta, do silêncio até a música, que pelo menos a beleza siga me comovendo - antes que eu desista Ou que a beleza desista de mim. Se a beleza se revelar com uma mulher por perto aí eu sou capaz de encarar o mundo e vencê-lo, se não por nocaute, pelo menos por pontos. Cá entre nós, da trincheira que é esse quarto de escritor, é o que tenho feito. A rua e o nada... a rua e o nada... a rua e o nada, meu tudo.


r.A.


ps. Para ela. A poesia hoje velou seu sono.

  





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