“Brotará
por azar, não por sorte! Quando azar for sinônimo de resistir”. (r.A.
respondendo um questionário sobre literatura).
......Aconteceu
na escola, lá pelos meus 15 anos. Não conseguia ouvir e prestar atenção nas
coisas que os professores diziam. Em partes porque os professores eram chatos!
Em outras partes porque eu é que era um idiota. Diferente dos idiotas em geral,
não me achava alguma coisa, apenas vivia perdido. Também vinha de uma família
recheada de problemas, mas isso é choradeira. Andava pela biblioteca da escola
olhando todos aqueles livros e vez que outra retirava um da prateleira. Alguns
até conseguiam prender minha atenção por algumas horas, mas em geral, não tinha
a disciplina necessária para absorver alguma coisa dos livros (ou a maioria era
uma bosta mesmo). Por outro lado, não achava as pessoas e o mundo mais
interessante que os livros. As pessoas só falavam – e continuam falando- de si
mesmas. E suas vidas me davam – e continuam me dando – sono. Foram épocas
estranhas que simplesmente não fazem nenhum sentido para mim. Parece que uma
manhã eu acordei e já tinha 15 anos. E fora algumas encrencas em que me metia –
geralmente brigas violentas-, não tinha feito nada e não sentia que faria
alguma coisa, dali para frente. Havia uma fatalidade pairando sobre mim.
Aqueles que me viam, de longe sentiam que em algum momento eu sentaria sobre uma pedra e esperaria morrer de
tédio. É. Dramático e enfadonho, mas é assim que penso que era. Até que um dia
um sujeito magrelo e baixinho chegou para mim e disse:_ Cara, você é muito
idiota! Deprimente! – esse sujeito passou a ser meu melhor amigo.
......Era
uma época ridícula em uma cidade patética do interior. Tudo que rolava era
melancólico, porque não havia muito o que fazer. Quem não gostava de transar e
jogar bola, ou bebia, ou se drogava, ou desembocava na literatura. Eu fui um
dos que desembocaram na literatura. Encontrei um livro em uma sessão reservada
da biblioteca – permitida apenas aos professores. O livro era do filósofo Arthur
Schopenhauer. Foi a primeira vez que cada palavra que lia, cada parágrafo, cada
capítulo, parecia estar direcionado para mim. Voltei várias vezes até a
biblioteca para ler aquele livro. Cabulava/gazeava aulas, muitas vezes, para
ficar em um canto da biblioteca folhando aquele livro. Implorei para o
bibliotecário me deixar retirá-lo (embora já tivesse lido o mesmo livro mais de
três vezes) e como ele não me permitiu, acabei roubando o bendito livro. Este
encontro inusitado com Schopenhauer fechou um milhão de portas na literatura,
para mim. Já não tolerava as dez primeiras páginas de outros livros. Tentei
outros caras: Platão, Kant, Marx, Foucault, mas não deu. Isso no mesmo gênero
literário – Filosofia. Na literatura clássica então, nem se fala! Folhei a
biblioteca inteira da escola atrás de alguma coisa, folhei os clássicos da
literatura brasileira – Machado de Assis parecia um jornalista e detesto a
escrita jornalística! Então migrei para a poesia. Augusto dos Anjos, Fernando
Pessoa, Baudelaire, foram alguns de meus camaradas. Depois descobri o Marquês
de Sade – Romance emprestado por um professor de sociologia – e Nietzsche.
Nunca mais saí de Schopenhauer e Nietzsche! Flertei, nessa época, com
escritores anarquistas, mas me pareceram cristãos demais! Enfim, foi isso tudo
que descobri com 15 anos.
......De
lá para cá se passaram 10 anos. Quando a literatura me cansou, caí na música.
Descobri uma porção de outros (as) escritores (as) que transformaram meu tédio
em algo produtivo. Enquanto isso preenchia cadernos e mais cadernos com
escritos – pequenos contos, ensaios, poemas, etc. Na universidade comecei a
frequentar oficinas de escrita e os pretensos escritores quase me mataram de
tédio! Talvez eu seja mesmo um desaforado, um arrogante, qualquer coisa ruim
que se possa imaginar, mas definitivamente, quanto mais conhecia pessoalmente
gente que se dizia “das letras”, mais me decepcionava – e não era uma decepção
no sentido de expectativas não correspondidas! . As exceções foram sujeitos que
não estavam interessados em ser escritores – parecia que esses escreviam
“melhor”, mais sinceros, sem forçar a barra.
Percebia que quando alguém decidia dizer sobre si mesmo “sou um literato
ou intelectual”, um pequeno grupo o cercava de mimos (como uma nuvem de moscas
na merda) e o transformavam em um imenso imbecil – ou talvez esses sujeitos
sempre foram imbecis, só as lisonjas os encorajaram a sair do armário.
......Com
toda essa experiência frustrante e desencorajadora na literatura, nunca pensei
que um dia me dedicaria a ser um escritor. Ao longo de uns três anos passei a
“limpar” minha escrita afim de encontrar um estilo por conta própria. As
receitas passadas por outros escritores e os patéticos exercícios passados em
oficinas só me ensinaram tudo que eu devia evitar. No fim das contas entendi
que apenas quando escrevia coisas que podia suportar ao ler – muito poucas,
aliás – é que daria um passo titubeante no vazio. Nada de colegas e professores
me dando tapinhas nas costas! – Espinhos envenenados brotam de minhas costas...
......Deve
haver mais algumas centenas de motivos para se escrever alguma coisa. Mas
comigo, tudo se resume a solidão e fratura. Escrever e consultar os outros para
saber o que acharam – e olha que essa é uma das receitas de alguns escritores
aclamados por aí a fora!- não passa, para mim, de desperdício puro. Obviamente
não há escritores sem leitores, mas um bom escrito é “para todos e para
ninguém”.
......Quando
me entrego a um auto exame, raras vezes chego a concluir que outra coisa
poderia ter feito de mim. Escrever se tornou um jeito de me virar – apenas.
Escrever também, numa perspectiva de defensiva, é um ótimo jeito de escapar do
que os outros pretendem fazer de você! (e não se esqueça que você é o outro de
si mesmo!). Saturando com faca quente os membros decepados em uma
desconstrução, dá para evitar todo tipo de pomadas que venham a querer aplicar
nos seus ferimentos. Fama e sucesso – seja lá o que essas duas palavras
sonolentas signifiquem- são metas para quem não experimentou aquela sensação de
um porre de vodca barata. “Saldo positivo” são palavras que figuram no
dicionário dos mais palermas! Qualquer sujeito que experimente algum contato
com a arte e se sinta realizado com isso, certamente teve contato com alguma
outra coisa que disseram para ele se tratar de arte. Ninguém que é intempestivo
em relação à cultura saiu inteiro e sadio. Até um palhaço chora por dentro
enquanto todos a sua volta comemoram. Levar a “alegria e diversão” para o
público está mais para animador de platéia de show televisivo do que para arte.
Se não for isso, provavelmente Augusto Cury vai vender um livrinho para você –
se for o caso, está tudo bem, podia ser Paulo Coelho, Pe. Marcelo Rossi ou
Zybia Gasparetto! Quem sabe...
......De
outra maneira, há outra perspectiva para abordar essa ladainha toda sobre
literatura – e falar sobre literatura raramente não se torna ladainha e um
furacão tosco de opiniões! Poderíamos abordar por um viés de especialistas!
Períodos, catalogações de escolas literárias, contextualização histórica, a
merda toda, enfim. Como eu disse, há outra perspectiva, mas nesses casos
corremos o risco de levantar dados sobre um peido! – uma flatulência podre
também provoca suas manifestações estéticas... Mas depois de tudo isso que
escrevi aqui, acho melhor me poupar de certas coisas. Apesar de contar 25 anos,
já não tenho idade para voluptuosos sonhos seguidos de ereção e ejaculação –
não nesse plano, já que prefiro as coisas mais “carnais”. Foder, Trepar, são
palavras muito fortes para os especialistas! Eles preferem “forma e conteúdo”,
não é? – Que Erick Hobsbawn não tenha escrito A ERA DO SEXO ANAL é até
tolerável, afinal os historiadores levam a vida à sério e o sexo anal não
parece ter surgido com a organização social do trabalho (e eu me acabo de rir
aqui!).
......No mais, acabaram as ideias. Não tenho
nenhuma “sacada literária” para encerrar esse mini ensaio (o que prova que
talvez me torne um escritor frustrado!). Então fique com essa piadinha:
“Joãozinho chega para o seu pai em casa e reclama que seus colegas na escola
vivem o perseguindo e chamando ele de boiola. Seu pai replica:_ Bata neles! Ao
que Joãozinho responde :_ Mas eles são tão lindos, não consigo pensar em
machucar aqueles rostos másculos! O pai arrisca mais um conselho:_ Então corra
deles! E Joãozinho replica:_ Já tentei, mas não peguei a prática ainda de
correr de salto alto. O pai de Joãozinho, indignado grita:_ Pegue minha bolsa
enquanto eu retoco meu batom! Vou com você até a escola resolver esse
problema”.
r.A.
“Sem dúvidas um jovem promissor na literatura!
Quem diria que ele nos surpreenderia encerrando um ensaio com uma piada de
inclusão social?”- Times.
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