segunda-feira, 24 de setembro de 2012

"T" de tédio ou Outras portas









......Algumas pessoas – a maioria, imagino – se esquiva com todas as forças do tédio. Acho que não sabem dar valor a esta experiência de nada. É certo que se você sair por aí, logo se empolgará com algo e logo esse vazio lhe dará a impressão de ser preenchido. Basta você ir aos lugares certos. Eu, por exemplo, passei algumas horas olhando para a manta de São Jerônimo pintada por Caravaggio e de madrugada ainda estava pensando em Caravaggio morrendo aos 38 anos com o peso na consciência de ter matado um cara em um duelo. Mas um pouco depois disso, estava novamente tendo acesso ao nada pelo viés do tédio. Mas qual o sentido de contemplar esse nada?
......Em primeiro lugar, acredito que o tédio nos dá a verdadeira dimensão do tempo – como dizia o filósofo Cioran, uma experiência do absoluto no tempo. É mais ou menos o mesmo tom do silêncio. Quero dizer, uma vez que você aprecie o silêncio fica difícil achar que qualquer som possa penetrá-lo. Há pessoas – a maioria, imagino novamente – que não suportam o silêncio! Precisam estar o tempo todo ouvindo algo, falando algo. Depois do silêncio, até o barulho de uma colher caindo parece fornecer uma melodia. A maioria das coisas que as pessoas dizem violenta o silêncio! Melhor seria o assovio do vento – para mim, pelo menos. Já o tédio é entendido em um sentido demasiadamente pejorativo! Esta, geralmente, vinculado ao não haver nada para fazer... não diria que não há nada para fazer, diria que há pouca “graça” em um certo “grupo” de coisas mais imediatas. Porque não parar por um momento e aprender o que o tédio tem para ensinar?
......Em segundo lugar, penso que o tédio é uma comunicação de você com você. É a rota cega percorrida por um sentido que se choca com outro sentido causando uma quebra. A gente boceja para oxigenar o cérebro. É preciso essa combustão no seio do vazio para nos lembrar que o vazio está ali e se faz notar.  Como as pessoas foram acostumadas a uma cultura que afirma que tem de se estar o tempo todo em movimento, tagarelando e trocando futilidades, as pessoas pensam que o tédio é um malfeito a ser corrigido. O arrepio na espinha vem de uma relação “besta” que se faz do vazio, do nada, com a morte. Rapidamente se passa do tédio ao pensar sobre a morte. Talvez seja a falta de compreensão sobre ambas as experiências – ou fuga de ambas as experiências – que cria esta relação que rapidamente nos faz acreditar que melhor é estar fazendo alguma coisa ao invés de nada fazer. Quando São Paulo visitou os gregos politeístas deparou-se com o templo do deus desconhecido (um templo vazio...). “Vendeu” o Deus cristão para os gregos. Não seria a apresentação do tédio que ali ganhava forma “divina” ao invés da necessidade de um templo à ser preenchido?
......Em terceiro lugar, já vi várias interpretações para o escriturário Bartleby – de viagens na maionese fundamentadas em teorias da revolução à depressão -, mas continuo pensando que Melville não mandou dizer nada, o que escreveu foi só o que queria dizer. (Para quem não conhece a história de Bartleby, trata-se de um escriturário que um dia disse para o seu chefe, ao ser mandado cumprir uma tarefa, “prefiro não fazer”... o impacto é tão grande no seu chefe, que ele nem se quer consegue demiti-lo na hora...) Cogito a hipótese de que hoje ao invés do elogio do movimento deveríamos fazer o elogio ao “dar um tempo”! Em uma conversa sobre performance com um grande amigo, entre cervejas e ironias – em que debochávamos de uma relação feita por um palestrante entre Delacroix e Baudelaire -, ele me contava que Baudelaire passeava com uma tartaruga lhe ditando o ritmo. Hoje, minha tartaruga que dita o tempo, é um olhar desinteressado que se fixa mais na neutralidade das coisas do que nos movimentos e intenções. Porque não pensar por um momento – ao menos – que o humano não é mais do que fruto do bocejo de um mundo cansado, ao invés do centro das atenções? Não digo que se deva pensar isso sempre, digo que se deve pensar uma vez.
......O mesmo que se aplica ao tédio se aplica a tristeza – ao meu ver-, tenta-se corrigi-la : como se fosse um erro! Um dia, quem sabe, deixaremos de pensar que a tristeza é absolutamente triste. Mas as pessoas – a maioria, pelo jeito – vivem como se no seu “manual de instruções” estivesse escrito: Em caso de tristeza, comunique o fabricante e troque seu produto! Da tristeza passo ao amor: Relacionar insistentemente o amor à felicidade não parece uma piada? Uma bela frase me recorda do filme Vanilla Sky. No citado filme, um escritor diz para um bonitão que lhe rouba a paquera:_ você nunca vai conhecer a tristeza daquele que volta para casa sozinho! No fim das contas, “se você não prova do fel, não compreende o mel”. A ironia, que tá pouco ligando se suportamos ou não, sussurra uma vez mais:_ você sofre no final de um amor porque foi bom, muito bom! – e os imaturos no amor arrancam os cabelos da cabeça e gritam “Não! Não foi amor! O amor não faz sofrer”- para os que cresceram assistindo t.v. Xuxa, pode ser... mas no fundo você sabe que não é assim. Um amor que parece um carnaval não é um amor, é um porre! Imagine que ridículo é alguém que entra numa relação procurando apenas ser feliz... Novela das 8 – certamente! O mercado dos antidepressivos progride na mesma proporção em que tá cheio de gente no mundo querendo viver sem querer arcar com as consequências da vida. Sentir tédio, assim como sofrer de amor não é patético, patético é acreditar que basta atravessar a rua para se ver livre disso.
......Em último lugar, não pense que quem escreveu isso supera as coisas porque entende algumas coisas. Entender não alivia, intensifica! Escrever – como dizia Efraim Medina Reyes, que não menosprezo por abandoná-lo – “é um problema a mais”. Não penso mais como Nietzsche, que “o que não nos mata nos torna mais forte”, penso que a gente filosofa porque aguenta! E quando não der... tá tudo bem.

r.A.
Em algum lugar da fria e cinzenta São Paulo.

=>Para Ana Paula Machado. O significado da palavra Irmã – no meu dicionário.

domingo, 23 de setembro de 2012

A revolução não será Facebookeada!!!





......Quanto tempo ein? Pois é, estive nos últimos dias tão ocupado com tanta coisa que não tive tempo para parar e escrever algo apropriado para o presente blog. É claro que para meus leitores qualquer coisa não basta!  Passamos ao assunto.
......Há algum tempo – anos, eu diria – fui requisitado por alguns “jovens próximos” (chamar de amigos também é um exagero) para falar sobre toda esta “atividade” que vem causando a internet enquanto construção de um novo espaço – na verdade esse papo é velho e já comemora mais de dez anos...- e na época, percebendo que o objetivo era me tencionar a afirmar (e não discutir) algumas ideias que já fazem parte do catálogo de políticas que se querem – e por isso se dizem – revolucionárias, me resignei a concordar ou discordar sorrindo (acenando com a cabeça) e falar unicamente do blog. Não foi surpresa para mim quando vi a minha tal fala publicada em um web programa que recortava (descontextualizando, obviamente) minhas falas e reduziam a apenas um ataque de risos. Acredite, achei que foi melhor assim. Teria ficado chateado se tivesse dito mesmo alguma coisa – o que desconfio que seria cortado também!
......É assim que a gente descobre a impossibilidade de imparcialidade no jornalismo – mas tudo bem, também. Ninguém aqui é tão ingênuo. Em todo lugar tem os ditos “grupinhos” – prefiro chamar de “panelinhas” (é que lembra pulga!)- e provavelmente continuarão sendo grupinhos... Uma prova? Hora, é só nós analisarmos onde estamos. Uns, ainda nas velhas reclamações: eles pintam, retorcem, adornam, mas no fundo é a mesma “querendo se passar por” outra história!  É até engraçado como o velho conceito de luta de classes – marxista- é jogado em qualquer outra discussão, nem que seja sobre a internet (dizia um amigo meu marxista que o próprio Marx não reconheceria o que fizeram do marxismo). Na minha ideia – do jeito que se vem aplicando o conceito-, basta cortar um grupo ao meio e inventar oposições, daí se diz que um lado é mais prejudicado do que outro e eis a dita luta. Daí a gente passa a falar em democracia afim de sanar esse problema que de inicio criamos no plano dos pseudo-conceitos – digamos, para equiparar as forças (Marx não contava com a incorporação das lutas de classe numa democracia capitalista – não podia pensar isso no seu contexto sócio histórico)! Mas como não somos tão ingênuos assim, sabemos que essa equiparação de forças é um ideal utópico postergado ao infinito. Aí se junta isso – fazendo uma salada de coisas completamente singulares afim de acabar com essa singularidade – e joga na “esteira da história” (já que ela tudo “suporta”- será?) e por último (mas não menos importante) acrescenta-se uma pitadinha de “dialética” e a essa confusão e atropelamento de conceitos se sai gritando: MOVIMENTO! E os desavisados acreditam.
......Cá entre nós, leitores, sempre que alguém fala demais em movimento – não sei porque diabos – vejo- os estagnados a um nível inimaginável! Só vejo o movimento da matraca lançando cuspe e a língua fazendo “plac, plac, plac”. É que é simples estar em movimento. Todos estamos, se não já não existiríamos – e não estou reduzindo o movimento a mera determinação orgânica, já estamos bem grandinhos para compreender certos conceitos...-! Mas aqueles que falam demasiadamente em movimento tentam é convencer o outro que ele está parado: “não! Você não está em movimento. Você não possuí uma ideologia política, social, cultural, banal, longitudinal, paranormal, balalau, bacalhau”, etc. Aceitando a ilusão vendida pelos pseudos conceitos, o outro adere ao dito “movimento” e assim, no fundo, não adere a movimento algum, apenas passa para a esteira ideológica dos tagarelas. Bingo! Você acaba de ser enganado! Mas falta um detalhe ainda. Vamos acrescentar: uma vez passando para a esteira ideológica dos que estão “em movimento” – que no fundo isso é uma piada! – esses incentivam os iludidos a defender a ideologia recém adquirida. É que quem adquire a tal ideologia do tal movimento sente-se como parte do “bando” enfeitando a si mesmo quando defende sua posição – daí é um passo para o fanatismo! Se você arriscar dizer para essa gente:_olha, acho que vocês estão equivocados! Rapidamente eles te demonizam, dizem que você é contra tudo de bom e fofinho (risos), dizem que você é medíocre, inimigo da democracia, ressentido e invejoso – é que de ressentimento e inveja essa gente entende muito: eles escovam os dentes na frente do espelho, não escovam?
......Então, foi por isso que quando me chamaram para falar sobre a internet, blogs e essas coisas e me deparei com uma mudança radical do tema para: será que a internet se configura em um novo espaço para revoluções e resistências a um mundo capitalista? (viu como os temas mudam muito rapidamente?) eu apenas sorri e acenei positivamente com a cabeça! E o que mais eu poderia dizer? Me lembrou aquelas aulas forçadas de interpretação de texto. Ex: Napoleão andava com seu cavalo branco. Responda: a) Quem andava no seu cavalo branco? b) Que cor era o cavalo que Napoleão andava? c) Faça uma crítica social aos direitos dos cavalos brancos de poder optar em ser montado por Napoleão ou Bonaparte – direito este construído ao longo da história que deve ser retomado através das lutas do movimento equino. Aproveite para citar a atual crise democrática nos meios midiáticos que implicam o movimento equino .
......Você acha que estou tirando sarro né? Mas eu não estou... Não estou.
...... Veja bem, mas veja bem mesmo, que quando falo desta história de movimentos, de ideologias, de revoluções via internet, em nenhum momento estou me posicionando contra. Aliás, sou plenamente a favor desde que haja uma fundamentação bem precisa e objetiva. Desde que não se saia por aí com discursos inflados que não resistem a uma pequena crítica sem ter de chamar “o que critica” de medíocre- se essa for a melhor resposta, na boa, que vão catar minhoca no asfalto. Não uma brincadeira de adolescentes que não tem o que fazer no domingo.  Certa feita um cara com uma máscara do personagem V for Vendetta me parou na rua e me disse que se eu não aderisse a uma tal marcha, estava compactuando com o sistema capitalista. Quando perguntei sobre seus motivos – mas não os superficiais, queria saber os mais profundos – o tal “V” não tinha o que me responder. Pobre V... se estivesse amarrado a um colete de bombas não saberia porque se explodiu. Ah sim, é pelo movimento. Tá certo... (risos).
......Acredito que seja possível – porque é e foi- pessoas organizarem-se pela internet para protestar (desde que não queiram definir o que são aqueles que não aderem a suas causas, porque isso é canalhice pura! Tipo: quem não concorda com a gente é medíocre – como já vi alguns vergonhosamente fazendo...). Coloco uma questão junto a esse parágrafo: Alguns alunos meus me convidaram para participar de um encontro organizado via internet (um protesto tal...). Perguntei a eles: do que se trata?  Não souberam me responder. Tive de pesquisar e aproveitar minhas aulas para conduzir um debate sobre... Quer dizer, esses movimentos estão em sua maioria deste jeito! Aí aparece – já que estamos em época de campanha política (no sentido partidário) – um candidato e sobe no palanque para prometer mais cultura e educação (é que ele tem um discurso coerente e além do mais é nosso chegado...): Pô, até minha vó que não está concorrendo anda prometendo isso!  E daí estufa o peito e diz:_ e vê se vota, ein? Se não votar você é um medíocre! (HAHAHAHAHAHAHAHAHA). Tá certo piazão, tá certíssimo! Baita proposta. Parabéns, tá? – nem vou continuar essa parte, vou deixar para o próximo texto.
...... Acredito que a internet constituí –hoje- o maior espaço de expressão e relação, mas desconfio muito da tal da comunicação, creio que o objetivo maior deste espaço é a interação – que não implica necessariamente comunicação. Recordo-me agora de uma instalação (no sentido de linguagem artística) que vi em uma bienal de Porto Alegre. Consistia em um computador enorme que nos incentivava a interação. Mas quando você iniciava sua interação, o computador simulava que quebrava – deixando você que nem um bocó mexendo e achando que a culpa foi sua. Dá o que pensar, não dá? Se você esta entusiasmado achando que a revolução não será televisionada, mas será “facebookeada”, cuidado para não dar pane no seu computador e você não conseguir fazer a tal revolução! Então a gente segue interagindo – e se cutucando – no cyber espaço, planejando manifestações e caminhadas de indignações, e eu continuo pensando que a maioria não sabe porcaria nenhuma do que esta fazendo e é alvo fácil para agitadores que no fundo só querem se autopromover. Desconfio sempre dos coletivos – porque acho eles alienados. Tenho certeza que não basta fazer parte de um grupo, movimento ou coletivo – esqueci de mencionar, eu faço parte de um grupo, se chama “humanidade”, um dos maiores, por sinal – se você não for capaz de compreender alguns pormenores de sua participação (e a boa e velha crítica – juízo!). Se não, tanto faz. Também faço parte do grupo dos fumantes – conquistamos mediante muita luta, até a nossa ala em todos os estabelecimentos -, dos tomadores de voodka (não conquistamos muita coisa, temos a voodka e isso nos basta!).
......Por fim, se você está se retorcendo porque não entrei em superconceitos sobre a internet, não falei de empresas e a coisa toda e julga que não falei porque não sei, “Vá com Deus – parã rarãn – o amor ainda está aqui, VÁ-COM-DEUS” (música da Sula Miranda pra você!). E se você não leu o texto até o fim, você é um medíocre –HAHAHAHAHA-, brincadeira, não é não. Não é tão fácil ser um medíocre assim. Tem que estudar muito e fazer muitos projetos, escrever vários artigos, etc.


r.A.- “Fisólofo”

[...]Mas num mundo de débeis mentais, temos de imitá-los. Não sei se me entendem. Mas para viver, para sobreviver, para coexistir com os demais, o sujeito precisa ir ao fundo do quintal e lá enterrar todo o seu íntimo tesouro.
_Nelson Rodrigues.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Eu...




......Quem separa as palavras das ações rasga o humano em pedaços. Palavras, “afetações da alma expressas em signos e símbolos”. Quem busca uma coerência no mais íntimo, possuí uma ficção de movimento. A vida não esgota em nenhum sentido – em nenhum momento – um fluxo violento... somos uma vírgula no texto da humanidade que termina em reticencias. Nietzsche dizia que a maior inimiga da verdade são nossas convicções e não nossas dúvidas. E assim se mantém viva a singularidade do movimento das chamas – sempre diferentes – “eternamente” conflitantes, em outras palavras: o vigor de pensamento do filósofo. Heráclito pensativo ao redor da fogueira.

......Deleuze e Guatarri apostam suas fichas em um caso. Diferente dos sábios que pensavam por imagens, surge os filósofos que pensam por conceitos. Está é a criação na filosofia, o conceito. Uma “totalidade” fragmentada com inúmeras “peças” que encaixam e se desencaixam. Que se movimentam rasgando o caos, que nunca tiveram a intenção de ser fixas. Um conhecimento andarilho, primo da arte, discursivo no mesmo grau da poesia, bebe do copo da lógica – mas sabe que a lógica é de princípio ilógico -, hora heroico e sereno como a face de Apolo, hora outra, embriagado e destruidor como Dioniso. “O filósofo é dinamite” – nas palavras de Nietzsche. Para si, para os outros, ninguém toca no filósofo sem pagar o preço de botar as mãos em um fogo que faz arder até a escuridão dentro de si. A história e a ciência estão aí para serem usadas! Peças ou suportes do conceito, na medida do que o filósofo achar necessário. O filósofo é senhor do seu conhecimento e batiza suas crianças selvagens. O corpo participa e é atravessado por essa força – como escreveu Rimbaud – “morro e me decomponho”- foi título de minha última exposição na universidade-, mas o que é vida não morre! “Nunca disse que filosofo para você, mas você insiste que pratica a medicina por mim. Simples demais! Quais são suas motivações?” – Diálogo do filme: Quando Nietzsche Chorou.

......Cioran disse “Adeus a filosofia” e nesse momento passou a filosofar em dobro! Disse adeus a um tipo de filosofia – que o mantinha como refém... “O filósofo não é uma cabeça de anjo alada”- resmungou Schopenhauer. Foram tipos de ruptura que só aqueles que fazem a tradição arder em chamas podem protagonizar. “O resto é a humanidade”.

......Robert Johnson saiu do Delta- Mississipi – para voltar com outro blues (e parar de pagar pedágio a “velha guarda”), e você pode ler Bukowski pensando que não passa de um velho bêbado que sente três tipos de náusea olhando para a humanidade. Mas “toda filosofia dissimula uma outra – toda opinião é um esconderijo”. Séculos se passam até que alguém, andando pela sombra de uma rua deserta ou em pé dentro de um quarto escuro entenda que “fidelidade” ao pensamento é transgredir – ou Thoreau não acharia desperdício de pedra e argamassa a estrutura de uma prisão. “O maior dos consensos nunca produziu um conceito se quer”- pensou Deleuze, e daí pulou a janela. “O consenso dos sábios não significa sempre sabedoria, pode significar que estão todos sofrendo da mesma doença” – anotou alguém em uma folha e depois penteou o longo bigode enquanto sorria olhando para a lua. Tai um cara esperto – “ que acende o cigarro no relâmpago”.

......O óbvio é que estou escrevendo agora, mas você nunca irá saber o valor do slow blues que ricocheteia dentro do meu crânio! Nem tudo é intimidade entre nós – parceiro! E o slow está para além da capacidade do músico de contê-lo. É a obra que supera o criador. Seu inicio escapa da história – como todas as grandes coisas que regem essa humanidade caduca! Eu já vi um filósofo tacando fogo em suas anotações e me ensinando: isto está destinado ao fogo! É tudo conhecimento superado. Ele olhava para o fogo com uma dor que nenhum escritor pensou ou conseguiu registrar. Tolkien escreveu o Hobbit – e hobbit foi fruto de alguém que escreveu a palavra rabit errado. O subtítulo de Bilbo Bolseiro foi “lá e de volta, novamente”. Imagino que Freud não leu o Hobbit. Mas Lacan não deixou barato o desejo e sua “mania” de repetição. Acho que Foucault gaguejou por um momento quando teve Lacan na plateia de uma de suas exposições. Lacan não brincava em serviço – ou brincava sério, o tempo todo!  Também acho que um frio transpassou a espinha de Foucault antes de Lacan dizer:_ achei que você ia falar outra coisa...(surpreendido!). Se você não entendeu, tá tudo bem. Há coisas que não quero que você entenda. Agora.

......Eu me sinto filósofo. Na medida em que estou corroído por questões – me dedico a elas (as questões) nem pela fuga, nem pela reflexão, muito menos pela crítica, pago o preço da paternidade de minhas crianças selvagens . Eu não quero mais explicar nada. Eu só me expresso, quando a expressão me supera. Eu sinto como um artista, arregaço as palavras como um poeta, e me expresso com conceitos – sou o amigo “cruel” e “incendiário”. Eu escrevo porque o meu corpo aguenta. (Leia mais devagar agora): Eu “vou sendo o que sou” porque o meu corpo aguenta! Mas eu não escolho o fácil. É o difícil que me escolhe...

 

 

r.A.- Filósofo.