sábado, 24 de setembro de 2011

Eu não mato para comer, mas se achar morto...





.....É claro que eu disse para aquele filho de uma puta que poderia mexer com minha mulher, mas nunca beber no mesmo copo que eu! Disse isso naquela madrugada, uma terça ou quarta, porque sabia que desta vez havia encontrado uma boa mulher. Boas mulheres possuem um coração que funciona como um diapasão para afinar a vida no ritmo de um velho blues. Ela, é claro, não passa de uma encrenqueira e por isso não se aproximava de mim sem esfregar uma coxa ou um seio – no braço ou na perna. Depois saia trotando “tipo vaca” sem olhar nos meus olhos. Pudera não ter de pagar o preço de minha pose de durão. Mas estava lá, de qualquer forma, escorado em um canto escuro do bar e zona “Sarjeta H.I.V & Cia”, enquanto ela dançava sobre as mesas e outros ridículos (como eu) introduziam-lhe trocados no fio da calcinha. A luz fraca e vermelha brincava com a imaginação e imagem que eu tinha do inferno. São as cadelas que valem à pena, pensei. No mínimo mantêm o amor na periferia da alma! Lá onde todo amor sufoca.
_pensei em tirar a Regina desta zona... – disse Walter. E tragou seu cigarro.
_...quê?
_PENSEI EM TIRAR A REGINA DESTA ZONA! Fazer dela minha mulher!
.....Foi aí que bati meu cigarro no cinzeiro e dei uma gargalhada que me fez cuspir a vodka da minha boca. Eu morava nos fundos de um depósito de cerveja. Um quarto de dois por zero... praticamente dormia em cima de um muro. Vivia o frescor de meu fracasso e me arrastava noites a fio como um lobo velho, sarnento e pulguento. Nas últimas... No entanto era novo.
_do que está rindo Juarez? Perde a noção do perigo, veado de merda? – Walter bate com o copo de cerveja em cima da mesa.
_depois de ter comido sua mãe, suas irmãs e até sua filha, não temo mais mal algum! – retruquei e reguei a goela com vodka.
.....É claro que tinha em mim um certo medo de Walter. Ele era maior que eu, mais gordo e mais feio. Mas estava raivoso naquela madrugada. Nada acontecia nas porcarias dos bares e isso me deixava angustiado. Precisava de uma encrenca para me sentir ocupando um território. Aquelas putas todas que estavam no bar já haviam me rapado os bolsos mais de uma vez. Rapado os bolsos e esvaziado os colhões! Nenhuma valia um pila, exceto ela... que eu devorava com os olhos...
_tem escrito alguma coisa...?- Walter mudando de assunto e se acalmando.
_não. Nem uma maldita linha. – Respondi olhando para o copo vazio.
_eu sabia que um porcaria como você romantizava demais uma vida marginal... agora que vive uma, descobriu que é um lixo de vida e não tem graça alguma...-disse, ergueu o copo como se brindasse e lançou a bituca de seu cigarro por cima de minha cabeça.
.....Não respondi. Não queria pensar sobre aquilo. Só queria pensar em vodka e sexo. Walter se achava grande coisa, mas não passava de um boiola acadêmico. Tinha teoria para tudo. Atacava de psicólogo quando bebia.
_não vai me responder?
_...quê?
_o que falei, ora...
_enche essa boca de cerveja e pare de falar comigo. Com todas essas mulheres rebolando, acha que vou prestar atenção nessas merdas que você tá falando? – Servi meu copo até a borda com a cerveja de Walter. Este acompanhou meu movimento com olhos desaprovadores.
_sabe Juarez... literatura é farsa pura! Seus heróis são de papel e tinta. Até um pescador é mais verdadeiro que Dostoiévski ou Kafka! – Novamente ergueu o copo como se brindasse no ar. Um ar carregado de fumaça de cigarro e cheiro de boceta.
_...não sei... nunca li “Destoiorévski” e Kafka. –Imitei o gesto de Walter. Tentando irritá-lo. Não funcionou nem um pouco.
_e quer ser escritor ainda... – disse e riu.
_não. Quero vodka e sexo. Escritor... Tuft- Cuspi para o lado.
..... Um peito raspou o meu braço direito como a asa de um anjo. Olhei para o lado. Dois peitões, um o caminho para o paraíso, outro o do inferno. E Sabrina me tascou um beijo seco. Mulheres mais velhas... pedagogas do absurdo! Assassinas da inocência do mundo...Porões da torre de babel... “Querido, você vai ficar muito mais tempo por aqui?”. “Meu dinheiro acabou...”. Ela agachou-se como se fosse juntar algo, pegou a grana no fio da calcinha e meteu no bolso de minha jaqueta. “Agora você fica...”. Acenei com a cabeça. Acho que chegou a hora da cerveja! Sabrina saiu, “tipo vaca”. Aquele corpo... Perverso como as fantasias adolescentes! Compota de uma alma mentirosa sabor morango! Coxas tão grandes que mal conseguia equilibrar aquelas pernas no salto alto. Voltou a dançar sobre as mesas e arrecadar dinheiro dos trouxas...
_um homem que tem uma puta por amante não necessita de literatura, Walter!
.....Dei o meu xeque-mate. Walter abriu a boca torta para responder, mas voltou a chupar seu cigarrinho. Éramos, com toda certeza, uns lixos. Machistas que se arrastavam aos pés das mulheres! Por isso pose era tudo que nos restava. As mulheres sabiam disso – antes de nós, inclusive- e por isso não ligavam para nossos pensamentos idiotas. Não sei bem o que viam em nós. O dinheiro, acredito, era um “paliativo”.
.....Três horas depois o bar já estava quase vazio. Até Walter se fora sem proferir mais palavras – para minha grande satisfação. Sabrina passou por mim, agarrou minha mão e me conduziu para um banheiro que possuía a porta lascada. Sem proferir uma palavra encostou os joelhos na tampa do vaso, arredou a calcinha para o lado, virou o rosto de lado e sorriu. A melhor imagem do mês! Meu pênis não endureceu por causa da bebida e por isso simulei um desmaio. Com os olhos fechados senti um coice na costela e ouvi um “veado filho da mãe” antes de pegar no sono. Foi doloroso, acreditem.


r.A.- Para o amigo Luciano, pelo título emprestado.

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