sexta-feira, 22 de abril de 2016

Sabe o que para mim tanto faz?

“Eu sempre consegui pegar alguém”.
_Beckett. O inominável.



         Tudo bem se essa garota que acabou de entrar no bar dispara esse olhar sem vergonha na sua direção. Então ocorre que você que já passou dos 25 anos e continua sem ninguém – e provavelmente continuará assim por mais dez anos, mas jamais sozinho plenamente- entende como isso tudo funciona. Porque as noites de calor para sujeitos comuns como você são generosas se souber fazer de conta que merece mais do que vale. Ainda não é deprimente, pode piorar.
         Então ela vai até o banheiro, lá nos fundos, e retorna com a maquiagem retocada e se não fosse aquele olhar com o canto dos olhos e o sorriso com o canto dos lábios, tudo seria algo de indiferente. Outra cerveja chega na sua mesa – e seu colega magrelo enche os copos – e outra cerveja chega na mesa dela com suas amigas rindo sonoramente para demonstrar uma diversão natural. Natural?
         Chega sua vez de andar pelo bar com sua botina descolada e todos reparam – quando disse descolada é descolada mesmo, não é que é uma botina “bacana”, é que precisa de um sapateiro! – e aquela garota te acompanha com a cabeça e sacode as mechas sob os olhos.
         Note que você pensa em outras, outras garotas que não souberam lhe dar esse pouco que merece e você poderia obter isso sem tanto esforço e encrencas descartáveis. Se não perceber que foi um boboca até o momento, talvez essa seja a ocasião.
         Em um segundo pode lhe cair a ficha que faltava: tudo que vivi me trouxe até aqui? Foi para isso que trilhei ruas escuras em noites vazias ouvindo papo furado de imbecis? E você vai saber que não está morto! Bem vivo, rapaz.
         Quantas garotas podem lhe comparar com outros caras que lhe trataram muito bem, mas não foi o suficiente? Todas? E aquelas histórias todas que desperdiçou seus ouvidos para entender apenas que é dispensável? E aí você repara que foi sempre um burro, sempre tratado como um resto. Sabe muito bem que alguém lhe dirá:_ Não, não é isso, você não está me entendendo...
         Ria.
         Não esqueça de rir. O romantismo ficou lá para os alemães antes da segunda grande guerra. Você leu um pouco e sabe como essa história toda termina. Fique esperto, garotão. Tudo é mais simples do que imagina.
         Você termina sua ronda no bar e lá está ela acendendo um cigarro. Daí você se aproxima e puxa assunto, falando de um velho clássico do Rock. Ela finge prestar atenção porque no fundo todos fingem do mesmo jeito quando as intenções são evidentes.
         Sua vida está acabando, pense nisso.
         É hora de acordar para a realidade. As coisas são bem menos bonitas e bem menos fantásticas do que você queria. E embora estejam todos de olho em uma bela história é a poeira negra e os fluídos medíocres que sobram.
         O sexo é fácil e as declarações de amor impertinentes. Percebeu que depois de um longo período tentando mudar foi apenas seu excesso de imaginação que alimentou?
         Agora sabe o que para mim tanto faz? Ocorre que você jamais será como eles. Não nasceu para isso. Felizmente – como naquele poema - : Nascemos apartados.
         Amém.




r.A.
                 


quarta-feira, 6 de abril de 2016

Culpa de vocês!



         O que você não precisa entender é que qualquer um pode lhe falar do inferno. Eu, por exemplo, quando falo do inferno estou pensando em Dante e na bíblia sagrada. Não sou um escritor tão criativo assim e por isso fora destas imagens emprestadas só consigo, se tiver que falar do inferno, falar deste mesmo mundo que você e eu contemplamos todos os dias.
         As pessoas que me cruzam por aí me dizem que exagero e que no fundo o mundo não é tão horroroso e desesperador como faço parecer enquanto escrevo. Vai ver são meus olhos viciados a se manterem fixos no outro lado, aquele que não é o lado bom. Mas e se isso for uma estratégia, digo, se isso for minha maneira de perceber pequenas maravilhas perdidas em meio a tanta ruína? Bem, se eu disser que achei uma coisa bonita pode ter certeza que me comoveu pra valer. Esses dias ocorreu nas primeiras horas do dia.
         Gente legal escreve para compartilhar coisas legais que – não duvido – existem por aí. Meu caso não é esse, como você pode notar, só quero compartilhar que estou de saco cheio. E quando me encontro nesse estado de espírito, como não encontro ninguém que confesse suas angústias, preciso fabricar meu antídoto. Podemos acrescentar o seguinte: tipos como eu não acreditam que as pessoas são felizes tanto quanto querem parecer.
         Minha questão é simples: por que ninguém fala que a metade da semana é uma merda se você bate o carro, leva a picada de uma aranha nojenta, se dá conta que os representantes políticos (na sua maioria massiva) torram o dinheiro dos seus impostos em putaria enquanto você conta as moedas para o aluguel, sua garota está de tpm e espera que seja compreensivo, a televisão só mostra lixo e vômito (me contaram), seu marido atende à ligação da amante em pleno jantar, seu filho ou seu pai é um idiota incorrigível, o pastor da igreja na esquina da sua casa tem merda na cabeça e berra como um desgraçado – que no fundo é, de fato -; enfim, por que só eu e Dante falamos que quem entrar aqui precisa abandonar todas as esperanças? O resto do mundo em silêncio, me observando, encontrou o ingresso v.i.p.?
         Leia o texto até aqui para seu/sua parceiro/parceira e observe o comentário:_ Esse r.A. só reclama de tudo, deve estar bêbado! (Então... ainda não deu para ficar bêbado, mas não pense que não estou me esforçando).   
         Não nos entendemos, meu querido leitor, porque tenho azar e você tem sorte. Porque sou feio e sem talento, você é lindo e talentoso. Sou um filho da mãe pra lá de furioso e você suporta o Faustão no domingo – estou improvisando, não assisto televisão e por isso não sei se Faustão ainda está vivo... alguém me avise se ele morrer, ok?
         Esses dias fiquei comovido nas primeiras horas do dia, como dizia antes. Só que não é disso que vou falar, sinto muito (porra nenhuma!). Quero que olhe para seus amigos todos e, inclusive, no espelho e me responda o seguinte:_ O que foi que ganharam fodendo com esse planeta que habito?
         (Eu teria sabiamente escolhido Plutão).
         Sempre fui um preguiçoso e por isso nunca movi um dedo para alterar a ordem das coisas. Cale a boca se passou pela sua cabeça dizer que eu deveria fazer qualquer coisa para deixar tudo isso melhor.  Não é esse o caso. A culpa é de todos vocês – que leem, se masturbam pensando na mulher do vizinho, pagam suas contas em dia, querem o impeachment ou não! Um dia saí na rua e estava tudo virado numa palhaçada: vamos nos respeitar.
         As pessoas que me cruzam por aí me dizem que exagero e que no fundo o mundo não é tão horroroso e desesperador como faço parecer enquanto escrevo e só não sugiro para essas pessoas irem para o inferno porque tenho certeza absoluta que já estamos nele. Se alguém tem contato com Jean-Paul Sartre mando dizer que o inferno não são os outros, nada. O inferno é o que fizeram com esse mundo – sem a elegância de me consultar – e agora tenho que reclamar disso. Pois que essas pessoas tenham a sensibilidade de se mudar para Plutão e me deixar aqui! É o certo e o melhor para todos.
         Agora, sabe quando disse que qualquer um pode lhe falar do inferno? Eu menti para prender sua atenção. A verdade é que somente eu posso falar isso. Perderam a chance de falar disso e agora que encerro esse texto fique sabendo que se ousar o plágio meus advogados (um bando de merdas loucos para sangrar o bolso de alguém como todos advogados são) entrarão em contato imediatamente.
_Um último comentário senhor r.A.?
_Sim. Foda-se quarta-feira, 06 de abril de 2016!



r.A.

p.s. Foda-se H1N1, sertanejo universitário e funk, tudo isso é culpa de vocês. Eu sei.