Ao som de Start
wearing purple – Gogol Bordello
(Pois combina
comigo)
Será que imito as coisas inanimadas que
utilizo?
Falo isso encarando minha botina
favorita. Além de estar coberta de aranhões no seu couro, percebo que, vai
descolar nos cantos. Antes que eu me esqueça: simpatizo com coisas arranhadas e
descoladas.
Li um artigo sobre física quântica onde certo
fulano argumentava que é errado falar “objetos inanimados”, uma vez que, há
movimentos complexos e reações múltiplas até mesmo em uma pedra. Banana para o
certo fulano, não vou mudar a primeira frase do meu texto.
Segundo uma grande especialista no
assunto (mamãe) não vale a pena eu procurar um sapateiro para remendar minha
botina. Melhor seria comprar uma nova. Não vou dizer:_ Banana para a senhora!
Meu repertório de xingamentos vai só até a ciência.
A
botina vai ficar e pronto. Duvida?
Uma anedota. “O cúmulo da rebeldia é
morar sozinho e fugir de casa”. Agora percebo que nem nisso obtive uma vitória.
Até a fuga me cansou e terminei minha cruzada pelos bares da cidade – bem aqui!
Uma das coisas que confessei para um
senhor bigodudo foi que perdi meu coração em uma rinha de galo. Já apostei alto
nessa vida, sabe? (quem disse que parei?). Não contente com a confissão
aproveitei para acrescentar um conselho para o bigodudo.
_Na
dúvida aposte no mais pesado e não no mais bonito!
_Isso
vale para mulheres? – sussurrou pensativo com seu copo.
Olhei
para a aliança de ouro em um de seus dedos gorduchos.
_Não
vale, não.
Ganhei um pacote de salgadinhos de
cebola por essa sabedoria. Tenho testemunhas sobre o fato! Não foi? ein
Shirley?
Aproveito para informar esse senhor
bigodudo (não lembro o nome, mas sei o caminho para o bar que ele frequenta)
que seguirei sua dica de experimentar a cachaça da Cantareira.
Enquanto estava em minha fuga alucinada
e com minha botina (quase) descolada, uma evangélica depressiva tentou salvar
minha alma - praça Roosevelt.
O
que não contaram sobre mim para aquela loira é que se um dia perdi meu coração
em uma rinha de galo, outra noite, aluguei minha alma para comprar um violão de
blues. Devolveram minha alma tão estragada – descolada – que parei de usá-la. O
violão ainda uso. Dai que foi um bom negócio, apesar de tudo.
Quando for ao sapateiro perguntarei se
tem como remendar a alma junto da botina. Quem sabe costurar o couro da botina
com a alma. Veremos...
Além de fugir de casa, apesar de morar
sozinho; fui informado, por uma saltadora de catracas de metrô, que não era
certo alguém querer se desfazer de sua “vida interior”. Para essa aí, o que não
contaram é sobre a situação de minha alma. Veja só.
O gênero masculino está dividido, lá no
topo, entre Homens e Cães negros cheios de sede ao cair da noite. Homens mentem
e Cães negros desafiam. Não sei direito em que grupo me encaixo, mas a grande
dica é que estou sempre morrendo de sede.
Minha botina descolada, minha fuga
fracassada, meu coração perdido em rinha
de galo, minha alma inutilizável, minha sede de morte... atrás da máscara um
escudo e atrás do escudo um casal de pistolas.
Será que as coisas inanimadas que
utilizo me imitam? Elimino contradições com o tesão por ambiguidades!
“Todo seu bom-senso e juízo desaparecerão,
eu prometo, é só uma questão de tempo”.
r.A.