sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Sobrevivendo entre os homosapiens


..... Pensar que os anos passam e que este ano acabou, que este dia acabou, que novas chances estão por vir... Desejar melhoras, fazer votos, fazer promessas, lançar-se em simpatias, aquela coisa toda, o ritual todo, é tão engraçado. Uma espécie de comédia da esperança por pequenas causas perdidas. É o velho consolo no tempo... Mas não é no tempo, é em uma alegoria do tempo. Só repete o mantra da positividade aquele que oculta no seu sorriso um bom bocado de desespero. Erguer a taça no fim do dia é brindar a utopia insuportável da história. O peso morto das feridas que jurávamos estarem secas... mas a memória é implacável! “Feliz no amor, Adão teria nos poupado da história” – diz Cioran. Note que alguém pedirá para ser mais feliz no ano vindouro... Não foi feliz no ano que julgou passar? Não calejou a garganta ainda de tanto pedir graças e receber tédio?

.....Mas o mundo gira e nos arrasta, com razão ou sem razão. Mas se me fosse permitido fazer uma aposta, diria que na proporção de uma gota para com o oceano, a humanidade aprenderá a lição. Alguém, talvez, se dará conta que não é desse jeito que se encara as coisas. Que olhar para o braço bom não faz deixar de existir uma chaga no pé. Que a melhor maneira de celebrar um ano de assassinatos e injustiças seria no estado de luto. Mas se me fosse permitido fazer outra aposta, diria que a grande maioria celebrará – como se a si mesmo tivesse convertido em deus – o milagre da vida, ou melhor, o milagre de ainda estar vivo. E obviamente não é pouca razão para se festejar...

.....Quanto a mim, não suporto os últimos dias do ano. Parece que a hipocrisia vence no final. Não consigo me acostumar com isso... Porém, se eu erguer a taça, sei que minha felicidade será bem outra e que essa mania moderna de esperança não fez de mim uma vítima.

r.A.

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