quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Pedaços de um ensaio escrito ao longo de quatro copos de Vodca - ao som de Imitation of life (R.E.M.) !



(Título de referência a Bukowski)


......Uma caneta trêmula segurada por uma mão tímida sob uma folha em branco. Fora da moral cristã também há o sentimento de arrependimento? Um animal que desenvolveu a técnica curiosa de exteriorizar-se em signos. Existe algo de ridículo no endeusamento ao escritor. O escritor que não se sente um animal exibido em uma jaula de palavras está fazendo alguma coisa errada... levei 40 minutos para concluir esse parágrafo, já foi mais fácil – até onde me lembro.
......O bom escritor é aquele que ao escrever cria uma relação de empatia com seu público – MENTIRA! O bom escritor é aquele que possuí leveza e domínio das palavras ao expressar suas ideias – OUTRA MENTIRA!  O bom escritor...- MENTIRA! Não existe essa história de bom escritor. Ideia, expressão, técnica, domínio, blábláblá para boi dormir. Existem pessoas que não cabem mais dentro de si e para não explodir ou se atirar de uma ponte, escrevem. O resto é jogo. Jogo e tédio. Jogo, tédio e opinião.
......Não entendo como alguém pode (querer) se expressar sem fraturas e fricções. Gente de bem com a vida se vira melhor batendo palma para o sol, comendo maçã do amor, discutindo o socialismo X capitalismo no bar com os amiguxos, do que escrevendo. Quando escrevem há uma reprodução desnecessária do império da baboseira. Alguém disse (foi Voltaire?): “Posso não concordar com sua opinião, mas lutarei ao seu lado até o fim pelo direito que tem de expressar sua opinião”. Foi mais ou menos isso? Vou aplicar minha correção. Posso não concordar com o fato de você exprimir opiniões. Só.  
......Desconfio. Lá onde algumas pessoas dizem “acredito que...”, eu desconfio. Não sei dizer se sou realmente um escritor, mas desconfio que tenho feito isso direito. Garanto para você que não é algo que alguém deve se orgulhar. Um colombiano safado disse que “escrever é um problema a mais”. Efraim Medina Reyes é o nome desse tal colombiano, que não menosprezo por abandonar! E ele roubou esta proposição de um filósofo chamado E.M. Cioran. Um dia pretendo escrever uma filosofia para rebater Cioran, mas não aqui, mas não por enquanto... por enquanto sou jovem e molenga – mas não é disso que quero falar. Quero falar sobre Cioran ter dito que “a literatura é a verdadeira filosofia”. É claro que (só por hoje...) não concordo. Filosofia vive em um porão na casa onde a literatura habita. O filósofo é um palhaço tentando avisar que o circo tá pegando fogo! (Kierkegaard). Ainda assim, para qualquer um que escreve, que precisa escrever, que não explode nem pula da ponte por covardia ou descrença, escrever é um problema a mais. E escrever é, sem dúvidas, um gozo masoquista. Uma vergonha altruísta.
......Ninguém pode se dar bem virando-se do avesso e exibindo as tripas e o coração. Também não há dinheiro, nem reconhecimento, que pague o preço por esse ato de loucura espontânea. Seria uma terapia se o anonimato esfriasse essa febre! Quer saber mais sobre isso? Desenterre o cadáver de Lima Barreto e pergunte até ele responder. Ou melhor! Nem queira saber mais sobre isso... isso não é para você. Vá escrever num jornal – ziguezagueando entre propagandas de lojas e puteiros! Quem sabe você não se convence que é “O cara” ou “A mina” e deixa a literatura em paz. Eu conto assim: 1 no jornal, -1 na literatura! Eu também tenho minha matemática (risos). Obs: Lima escapa das funções matemáticas! Então não venha com o papinho de que estou sendo contraditório – eu esfrego o saco com paradoxos.
......Uma caneta trêmula segurada por uma mão tímida sob uma folha em branco. Agora já era! A virgindade da folha foi profanada. Dizem as más línguas que Pai é quem cria. Responsabilidade inimaginável para um vagabundo como eu. Justo eu que escrevo como quem depreda a vidraça de um banco – mas sem máscara e sem bando! Tenho concepções políticas óbvias: Sou de direita quando o copo de vodca está do meu lado direito – tipo agora – e de esquerda quando o cigarro está do meu lado esquerdo – tipo agora. “Os filósofos passaram séculos interpretando o mundo, agora é hora de transformá-lo” – Interpretou o filósofo Karl Marx. E como você pode perceber, cá estou do meu canto mudando o seu mundo e o meu mundo enquanto escrevo – isso porque você leu até aqui! Já sabemos o que faço com paradoxos... (riso triunfal).
......Caneta tipo espada em mão firme sob uma folha de brancura profanada! Rolou uma apatia entre nós (?), ou...



r.A.

sábado, 17 de agosto de 2013

A paixão é uma questão de... CALE A BOCA!



......As mulheres são difíceis! Se você disser o que pensa a queima roupa, elas só vão entender comparando com o que elas pensam sobre o assunto. Se você disser o contrário do que sente, julgando que dessa forma estará de acordo com o que elas pensam , elas discordam de si mesmas com o único objetivo de te afrontar! Por outro lado, se você não disser nada, elas partem para outro – afinal, elas não curtem esses tipos “caladões”. Se você falar demais, elas partem para outro porque você falou demais. Por fim, se você ficar confuso com elas e ir parar num sanatório, elas mandam uma carta dizendo que sentem muito – e uma foto com o atual namorado que ocupou seu lugar, já que você está no sanatório. Se você gosta de mulheres, vai descobrir que com elas você só acerta quando tem certeza que está tudo errado. Abri minha correspondência essa manhã e lá estava uma carta de Gabriela contando que o problema era com ela, não comigo! Finalmente concordei com ela e voltei para a cama para aproveitar uma linda manhã de sexta-feira, recheada de ressentimento.
......O lado positivo de enlouquecer sozinho porque uma mulher partiu seu coração é não ter que se abrir com ninguém, tão pouco receber conselhos de amigos que dizem que isso tudo é normal. O lado negativo é que gostava dela e, por incrível que pareça, achava que as coisas estavam indo muito bem – obrigado! – uma vez que estava me sentindo feliz. Claro que passou pela minha cabeça que estava sendo egoísta já fazia um bom tempo! – Mas ela escreveu que o problema era com ela, não comigo... Você acredita nisso? Eu prefiro acreditar. E pensar que quase fiz uma tatuagem com o nome dela... aquela vaca problemática! A psicologia não explica, mas a zoologia explica o motivo da natureza não permitir vacas e burros de formarem um par.
......300 horas se passaram na minha percepção, mas o relógio denunciou que nem estávamos próximos ao meio-dia. Quando a gente não se diverte o tempo conspira contra nós! Um ano e meio e parecia que conheci Gabriela ontem. Lembro que ela dizia que eu não dava ouvidos à suas necessidades – e dizia mais algumas coisas que não lembro direito. De qualquer forma a vida deveria seguir seu curso e aqui no sanatório estava faltando comida. De qualquer forma o mercado não muda de lugar mesmo que o mundo congele e parta aos pedaços diante de nossos olhos...Escovei os dentes, joguei água fria no meu rosto balofo e sofrido. Saí.
......Por dentro, sentia que estava acontecendo uma hemorragia grave. Quando a balconista do mercado – Ângela – disse “bom dia Adriano”, quase não consegui responder: o sangue já estava na minha garganta e me sufocava.  Devolvi um tímido “olá” e tive a sensação que uma bolha de sangue se formou no meu nariz. Andei duas vezes em cada corredor e acenei com a cabeça duas vezes para o açougueiro. Vi o meu reflexo no vidro da geladeira de cervejas – estava com a camisa do avesso! Mas a culpa não era minha, ainda semana passada estava feliz e sabia vestir uma camisa! Pelo menos a cerveja estava em promoção – sempre esta, por isso o preço é sempre o mesmo.
_Puxa cara, você está uma merda! – Resmungou o açougueiro quando passei pela sétima vez na sua frente.
......Suspirei e olhei aquele avental com respingos de sangue já em tom de rosa. Ria. Dei a única resposta que veio a minha mente.
_Pelo menos não sou um açougueiro!
...Continuou rindo. “Você é bom nos diálogos!”. Retrucou. “É que minha vida não se resume a ser gentil para vender carne” – Repliquei. “É que eu sou casado, sabe? Minha mulher não me abandonou porque sou um escritor falido”. – Achei boa a resposta dele e fiz uma anotação mental para usar em um conto mais tarde.
_...Não seria rude com um sujeito que bota um sorriso na face de sua mulher enquanto você está trabalhando! – disse.
_Você nem sabe onde eu moro! – sentenciou ele.
_...prefiro que você morra acreditando nisso, amigo!
......Uma veia apareceu na sua careca branca. Percebi que era a hora de correr. Nunca se sabe o que alguém com uma faca afiada na mão é capaz de fazer. Não que eu seja covarde, mas vivo de pequenas vitórias em pequenas lutas mesquinhas. – Aprendi essa com o Zorro. Infelizmente só consegui aprender isso...
......Voltei para o sanatório. É quase como estar em casa! Corrigindo: É com estar em casa. Sabia que Gabriela não estava lá, mas mesmo assim gritei:_ Gabriela, voltei! Não, ela não morava comigo. Gritei para o fantasma, afinal, o fantasma dela não iria embora tão logo. Melhor se acostumar. Chega uma hora na vida de um homem em que ele deve deixar a loucura aflorar! – quem é casado sabe do que estou falando. Deixar a loucura aflorar é quase um remédio, com o detalhe de que o remédio tende a curar: por isso o “quase”.
......Seus cabelos cacheados eram perfeitos, mas ela vivia reclamando deles. Suas unhas, bem cuidadas, acho que eram perfeitas – nunca foi de ficar prestando atenção em unhas! Seu sorriso, sua boca, seus olhos, suas pernas, a bunda, os seios, a força de vontade e a esperança e a perseverança – de estar comigo, quero dizer -, tudo era perfeito e ela vivia reclamando de tudo! Gabriela, cheiro e cor de café, até suas reclamações agora estavam tão nitidamente ausentes... vai ver eu era perfeito também – por isso ela vivia reclamando de mim! Por que as mulheres nunca reconhecem nosso esforço antes de fechar a porta quando saem? Eu bebia ao seu lado, escrevia ao seu lado, até ia no mercado ao seu lado – será que é pedir muito que se leve todas essas dedicações em consideração? Muitas vezes, relutante, deixei que ela lavasse minhas roupas... me sacrifiquei em nome dessa relação – qualquer um percebe! Até quando ela se filiou a um movimento feminista, aceitei desde que ela lavasse a louça! Não consigo entender como esse sonho lindo acabou...
......Depois da vigésima cerveja entendi que a vida deve seguir seu curso. Reli a carta de Gabriela e continuei aceitando tudo que ali ela manifestou – principalmente a parte em que dizia que o problema era com ela, não comigo... Bola pra frente, pensei, não dá para atrapalhar o movimento da vida! Peguei o telefone e disquei timidamente o número de Bety. Atendeu no quinto toque.
_Bety, aqui é o Adriano jr. Preciso de companhia para conversar...
......Uma voz calma e um pouco sonolenta respondeu do outro lado. “São trezentos reais a hora, querido”. Trezentos? – Refleti. Vai ver é à alta do dólar...
_Mas o táxi não vou pagar! – afirmei – As mulheres são difíceis!
_Já está incluso, querido! – sussurrou aquela voz macia.
_...Você é tão gentil...


r.A.


Decote...



......“Você pensa que o seu problema são as pessoas, mas o seu real problema é que você não passa de um imbecil” – Gritou Gabriela e depois bateu a porta. Um provérbio de Willian Blake dizia que “Aquele que já esteve sob seu domínio, te conhece”. Tanto faz. Blake é fresco e Gabriela vai voltar. A coisa toda começou lá pelas duas da manhã. Ela insistiu em me apresentar para dois amigos dela da faculdade de letras. Diziam eles que seria bom para seus estudos conhecer um escritor de verdade e trocar umas ideias... Bem, não sei o que é um escritor de verdade e desconfio da integridade moral de gente disposta a trocar ideias. Você já percebeu que todo bunda mole se sente excitado com essa ladainha toda de sentar num bar e trocar ideias?
......Lá estava eu, Adriano Maranello Jr, ouvindo blues em um bar e esperando os tais amigos de Gabriela. Minha camisa estava meio apertada na gola e meus sapatos novos estavam apertando os ossos nos meus pés; mesmo irritado com essas coisas, tudo melhorava meus ânimos uma vez que tinha o blues! Ela, com seus longos cabelos escuros e um decote descomunal, olhava apreensiva para o relógio. “Eles estão atrasados... será que se perderam?” – Resmungou preocupada. Aquela sua voz de menina meiga... Encarei seus olhos castanhos e sorri.
_...eles não vão vir. Vamos indo! – Falei.
......Uma faísca brilhou no fundo daqueles olhos castanhos. Aquele era o sinal de que eu acabara de irritá-la.
_...Sei o que você quer... Quer voltar para casa, transar, tomar um porre e ir dormir! Estou cansada disso Adriano! Chega de ficar trancafiado naquele apartamento! Precisa fazer como as pessoas normais! Conhecer gente nova, se divertir, porra!
......Exceto sobre o porre, Gabriela havia acertado. Exceto sobre o “fazer como as pessoas normais”... exceto sobre o “conhecer gente nova”... ela estava certa! A ideia do porre começou a ganhar espaço na minha mente. Ao som do blues, cantarolava mentalmente agora: O porre... o porre... tomar um porre e ir dormir... transar e tomar porre e ir dormir...
......Os caras apareceram. Estavam sorridentes. Tinham os dentes bem alinhados e as roupas bem passadas. Gabriela se levantou e acenou para eles. Primeiro abraçou o mais alto. Claudio era o nome dele. Estava vestido de azul e usava um cachecol vermelho. Tinha olhos grandes e voz anasalada. Depois ela abraçou o mais baixo. Jorge ele disse que se chamava. Usava uma jaqueta de couro e parecia que malhava da cintura para cima. Falava pouco, mas compensava sorrindo para todo mundo. Quanto a mim, até que fui simpático, até que apertei e sacudi a mão dos dois, quase me levantei da cadeira. Quase não sorri. Pensei nos avanços da pediatria, no quanto era complexa a manipulação de remédios nos laboratórios e nos conceitos chave do neoliberalismo. Aí acenei para o garçom e pedi mais uma cerveja e mais dois copos.
......Fiz um balanço geral sobre a situação. Bem: eles vão falar bastante... talvez duas horas? Aí serão quatro da manhã. Adriano é um sujeito de mente aberta. Enquanto bebe, consegue conversar sobre todos os tipos de assunto. Pode entrar e sair de qualquer pauta. Por exemplo, pode falar sobre o Oriente Médio, sobre a Rota da seda, sobre a economia atual, sobre o teatro e a dança, sobre as diferenças ideológicas dos jornais Folha de São Paulo e Estadão, sobre as costuras duplas nas botinas dos pedreiros, sobre a raça ideal de cachorros para se adestrar no interior afim de facilitar o trabalho com o gado, sobre o horóscopo chinês e o último filme sobre o Wolverine. É bastante coisa, não acha? Estipulei uma meta. Sair às quatro da manhã, pegar um táxi e depois pegar a Gabriela, tomar as seis últimas cervejas na geladeira, fumar um cigarro e ir dormir fedendo. O que faz um homem são seus objetivos e metas na vida! – e quantos rounds ele é capaz de suportar antes de cair ensanguentado ou jogar a toalha.  
“Tudo é simples, apenas não se mate” – dizia um cara que trabalhava numa ferro-esquadrilha.
......A coisa toda seguia conforme o planejado. Até que Claudio e Jorge foram ao banheiro. Gabriela esperou eles sumirem de vista e começou com a chateação:_ Caralho! Você só sabe dizer “sim”, “não”, “talvez” e “concordo”? Por que está sendo tão chato com as pessoas?
......Parecia ser uma questão interessante. Não havia me dado conta que tinha evitado por uma hora inteirinha qualquer tipo de conversa longa. “Então você escreve?- Sim – Gosta de Sam Savage, não é? – Talvez- Essa banda é boa... – Sim – Estamos estudando Graciliano Ramos na faculdade...- Concordo – É bem remunerado esse tal mercado editorial? – Não.”
_...Gabi... Prometo que entrarei a fundo no próximo assunto. – Jurei. “Assim espero” – ela reclamou.
......Vi, lá longe, nas outras mesas, que os sujeitos estavam voltando. Arrisquei uma apologia para salvar meu lado com ela.
_Gabi... Como posso te dizer isso... Sou um cara velho, sabe? Um sujeito um tanto cansado e sofrido... Tenho uma certa reserva para com as pessoas e além do mais, sou tímido...
......Gabriela girou os olhos nas órbitas e suspirou. Balançou os seios e isso chamou a atenção dos meus olhos para aquele decote. Essa parte foi ruim porque me fez pensar no preço que me custaria espiar um pouco mais daquele decote. Senti um minúsculo Adrianinho dentro de mim, vagando solitário por entre imensas geleiras, arrastando os pés com dificuldade. Na medida em que os sujeitos se aproximavam da mesa onde estava sentado, visualizava esse pequeno “eu” escavando com as mãos nuas no gelo em busca de um pouco de graça e simpatia. Lágrimas brotavam dos escuros olhos deste pequeno Adriano, mas decotes de morenas balançavam no horizonte gélido para incentivá-lo. E agora, dentro de mim, uma decisão fatal deveria ser tomada... uma questão de prazer ou morte! As mulheres não ligam para o gosto do fel na boca do sujeito que corre o risco de voltar sozinho para casa...
......A seis passos de Jorge e Claudio chegarem a mesa, Gabriela resmungou “Você não é velho e não é tímido, você é um mentiroso cara de pau”. Enfim, a verdade surge quando a gente menos espera, pensei.
......As intenções mais estranhas estão por trás de uma mulher que exige você ao seu lado. Às vezes você é bonito – esse não é o meu caso. Às vezes você é um sujeito em evidência que uma mulher pode usar para se destacar em um grupo – também não é o meu caso. Às vezes uma mulher te ama incondicionalmente – dizia mamãe... Augusto Cury, uma canção de sertanejo universitário e duas adolescentes bêbadas. Ou às vezes você é um cara legal com essa mulher e ela gostaria que você fosse tão legal como é com ela com os amigos dela... Tudo exige muito empenho!
......Quando os sujeitos voltaram, mudei da água para o vinho – um milagre, quero dizer! Porque na verdade mudei da cerveja para as doses de whisky. Teci tratados filosóficos sobre a literatura, a música, a existência e tudo mais. Eles adoraram, um deles até aplaudiu. Gabriela adorou o quanto me tornei afetuoso. Empurrei-lhe vários copos de cerveja até que ela sentiu de ir ao banheiro. Quando voltou os sujeitos decidiram que era chegada a hora de partir. Vai ver eles não gostaram muito do meu lado mais humano, concluí. Nos abraçamos afetuosamente, trocamos telefone, prometemos nos ver qualquer dia desses. Alguma coisa me dizia que esse negócio de conhecer gente nova, travar novas amizades e etc., enfim não era lá tão ruim assim.
......Gabriela acabou de bater a porta e dizer que sou um imbecil. É claro que esse tipo de situação é muito constrangedora para um homem. Mas pensando bem, acho que ela vai voltar... Olhei no relógio e passava um pouco da uma hora da tarde. Abri uma cerveja e sentei no chão do apartamento porque estava um pouco grogue – ressaca. Vi um bilhete sob a mesa do computador e estiquei a mão para alcançá-lo. Era, sem dúvidas, a letra de Gabriela – uma letra feia dos diabos! Li. “Imbecil. Não acredito que você subornou meus amigos para eles irem embora e quando eles não aceitaram o suborno, você ameaçou bater na cabeça deles com uma garrafa. Você é estúpido e não quero mais ver você! Espero que morra”.  
......Como ela descobriu o meu feito, nem sei. Imaginei que ela ligou para eles logo que acordou. Terminei minha cerveja com um pouco de vergonha de mim. Aquilo não foi muito gentil, realmente. Peguei o celular para ver se alguém havia me ligado nesse meio tempo. Ninguém. Decidi me castigar por ser um sujeito tão ruim – tomei banho e voltei para a cama.



r.A.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Nem r.A. desagradou todo mundo - mas quase!



......Maria Rilke, aquele poeta chato, quando um jovem lhe pediu “dicas” sobre escrita, respondeu o seguinte:_ basta sentir que seria possível viver sem escrever para não ter o direito de fazê-lo! (Cartas a jovem poeta). Lembro disso porque simplesmente não deveria estar escrevendo – agora -, mas estou. Comecei mentindo para mim mesmo que este blog “deveria” ser movimentado... Depois, pensei que faço isso por respeito aos leitores desse blog... E quando dei por mim, já tinha aberto uma cerveja... Acho que já devo ter dito em algum lugar que escrevo por obsessão (nunca por incentivo! Já que a maioria sonha com o dia em que eu sofra um acidente com uma motosserra e decepe as mãos!). Fora tudo isso, é ultrajante alguém se atrever a escrever depois de ler Lima Barreto. Podemos concluir esse primeiro parágrafo afirmando que: 1- escrevo por obsessão; 2- escrevo para decepcionar as expectativas do grande público (risos); e 3 – sou atrevido e ultrajante. Detalhe: Tudo isso depõem contra mim e de forma alguma é um elogio. Eu só não me mato porque não estou afim de antecipar o carnaval.
......Antes mesmo do contato com a Filosofia, sempre tive uma desconfiança em relação a qualquer entusiasmo humano. Quero dizer, sempre que vejo um grupo, um coletivo, um amontoado, uma turba, uma “galera”, animada com algo, começo a pensar que abismo esse “algo” oculta logo abaixo de si. Isto é, quê buraco, quê “falta de sentido”, a multidão está escondendo embaixo do tapete? Você não se pergunta essas coisas? – Sei que não! Depois, bem mais tarde, depois do contato com a Filosofia, eu descobri que “toda opinião é um esconderijo”. Então, talvez, esta minha opinião é que seja meu esconderijo! Do que me defenderia? Do grupo, do coletivo, do amontado, da turba, da galera animada – certamente!
......Aprendi lá com uns alemães ‘Modernos’ que ser um “indivíduo” é muito mais uma “inatualidade” do que um equívoco de concepção! Embora todo discurso “contra o mal e o capitalismo” fizesse por anos a fio me sentir meramente um descontente (risos). Hoje eu sei que se fosse meramente um descontente haveria ‘remédio’ para mim! – Me filiaria a um partido, ou Religião, ou Sindicato, ou Ong, ou Coletivo bem intencionado, ou Grupo que jura salvar o mundo e os animaizinhos sem lar, ou simplesmente tomaria uma injeção de paroxetina! Quem disse que resisti? (risos).
......A diferença entre quando era um adolescente atormentado e agora que me tornei um adulto debochado, é que finalmente descobri que meu lugar é exatamente esse aqui! Não exatamente o vagabundo baudelairiano, mas com uma preguiça imensa para com ocupar um lugar na bendita “Sociedade”. Isso mesmo, preguiça. Só de pensar em fazer uma defesa de cargo, dizer que não sou “qualquer tijolo no muro”, já começo a sentir sonolência! – Deve ser por isso que Pink Floyd não me encanta mais! Sou um aposentado da crítica e um entusiasta do deboche. Confesso que me assustei dia desses pensando sobre isso. Perguntei: Será que sou um cético? Quero dizer, será que agora suspendo todos os juízos, não acredito, mas investigo? Felizmente, ser um cético se revelou para mim um imenso trabalho – por isso fiz a finta e driblei o ceticismo! (Acredito em uma porção de coisas e muitas delas envolvem cerveja e vodca...).
 ......Ter consciência da tragédia que é a vida faz a gente desconfiar de todos os roteiros. Abraçar causas é um pouco ‘fácil demais’! Não digo isso no sentido de que não vale a pena “lutar” (essa palavrinha “lutar” tá meio clichê e molenga ultimamente...) pelas causas – claro que valem, se você acredita! Digo que é fácil demais, escorando-se nas benditas causas, definir quem você é (ou está sendo...). Ficou mais hipócrita ainda – atualmente – quando ninguém mais quer pensar que é o ‘vilãozinho’ da história toda! Tive uma experiência interessante em relação a isso, nessas férias. Quando quis fazer algumas pessoas – só para mexer com seus cérebros...- pensar que são “massa de manobra” na maior parte do tempo, obtive como resposta os discursos mais moralistas do mundo! (risos). Percebi que é ridículo ninguém querer pensar em si mesmo como um sujeito ridículo! (Imagine o constrangimento do povo Alemão no final da Segunda Guerra Mundial!). Só posso achar “incrível” – lembre-se que essa palavra tem um sentido etimológico...- que nenhum economista ‘sério’ ainda não tenha pensado no fator ‘Vergonha’ enquanto composição da economia (Oikonomos)– pelo menos a psicanálise e a filosofia, antes dela, pensaram nisso!
......Talvez, se você leu até aqui, deva estar pensando que estou escrevendo essas coisas por causa das manifestações que vem ocorrendo em uma grande parte do Brasil – e algumas partes do mundo. Se esse for o caso, sinto desapontá-lo, mas ainda nem terminei de pensar com cuidado sobre as tais manifestações! – Embora tenha muita gente por aí a fora vomitando pontos de vistas! Mas se serve de indicador sobre mim, revelo que sou favorável a maioria das manifestações (e participei de algumas delas!) – e não me sinto mais ‘O cara’ por isso! Em uma época de política “Maquiavelista” (vale mais o “manter-se no poder de negociar” do que a ética), é quase impossível sua manifestação não se tornar uma plataforma de campanha ou engrenagem para ataques partidaristas! Nota: Falarei sobre isso em outro texto.
......Cá do meu canto, esse lugarzinho não tão confortável quando alguns pensam, tenho estado demasiadamente exposto e por isso não dá para acreditar que minhas opiniões são esconderijos! Até pensei em me ocultar por trás de discursos políticos, utopias, ladainhas educacionais (a lá, pós graduação à distância em pedagogia...) e discursos do “amor & terno” para com a sociedade, mas ser um Homem me impediu desse fiasco e máscara! O preço que pagarei por isso, provavelmente, não será baixo. E esse texto não desagradará a todos – imagino – e certamente este será o risco maior de não conseguir parar de escrever.


r.A.