terça-feira, 27 de setembro de 2011

Certeza que não se enganou?


.....Uma leve caminhada para começar a noite e minha cabeça borbulha de pensamentos! Alguns anos dedicados “A tradição ocidental do pensamento humano”, de onde derivou direta e indiretamente todas as outras tradições de pensamento. Caminhando e tendo por companheiro o espírito questionador de tantos outros... Eles cochicham nos meus ouvidos, andam cabisbaixos ao meu lado... Mostram-me que não há nada de “anormal” estar deslocado no tempo, no espaço e na história. A brisa fria do abismo interior... Minhas implicações, o sangue que gela em um momento para no momento posterior evaporar no fervor! E Heráclito, Platão, Aristóteles, Descartes, Kant, Hegel, Schopenhauer, Nietzsche, Freud, Husserl, Heidegger, Sartre, Wittgenstein, Russell, Cioran, Deleuze, Foucault, e mais alguns, tem muito mais a me dizer do que alguns dos meus “contemporâneos”. Caminho mais uma quadra e essa legião de nobres senhores andam ao meu lado – mesmo sabendo que meu lugar é séculos atrás desses. Porém todos demonstram a cordialidade que fez desses os “grandes” e ainda perguntam para mim: e aí r.A., que acha você disso?

.....Algumas pessoas que não suportam o fato de que um espírito como o meu só pode crescer nesse cemitério – de vivos- usam de todas suas forças para fazer com que me ocupe de pseudo- problemas que vão da mais nojenta birrinha pessoal a uma falta de coragem e caráter para entender as coisas que digo por aí... E eu, como faz muito que não vejo sentido nessas “dramalheiras cotidianas”, estes desejos desesperados de atenção, ensaio um sorriso no canto da boca e viro as costas e vou embora.

..... Enquanto ainda gastam suas energias fuçando em uma péssima interpretação de “quem sou eu”, sigo “sendo” e pensando. Não esqueço por um minuto que minha vida é outra e consumida nas brasas da filosofia. E o vigor de pensamento que me conduz para lugares inimagináveis e por vezes insondáveis onde pasmo na escuridão ou na clareira, reabastece meu corpo que quase arrebenta em esforços subumanos! Ah, pois! Há um deserto de chumbo dentro de mim! Andamos nos equilibrando no fio da espada, eu e os espíritos afins! Aguardo o dia ou à noite em que chegará a minha vez de, morrendo, proferir minha única palavra, minha potencializada contribuição única...

.....Compreendo-os! De certo que sei de vocês todos que me cercam! Sei que vocês, mesmo que farejem o absurdo de minha tarefa não podem imaginá-la para um homem! Como pode um homem não aspirar – nem se quer- a ser sábio, mas amigo do saber? Para que infernos alguém ainda jovem desejaria viver mil vidas em uma só? Quanto mais se souber desta cidade de filósofos movimentando-se paralelamente ao mundo e semeando apenas fogo e sangue de seus barracos solitários, mais tenta se convencer que nada disso é necessário (se ignora por medo... Pois todo chão se movimenta na filosofia). Diógenes no cemitério com sua lanterna procurando por um homem vivo, pelo menos um... O “insensato” no mercado perguntando para a humanidade onde foi que Deus esvaiu-se em sangue diante de nossas facas... Cioran, olhando pela janela enquanto degusta seu copo de whisky, com olhos de fogo e tédio.

.....Não me desculpem contemporâneos que não entendem a menor de minhas ações e o absurdo de minhas palavras, mas não há arte e nem literatura, psicologia ou ciência social, psicanálise ou ciência política que substitua essa vida que um filósofo chama para si! Viver na filosofia é outra coisa e fora da história! Vocês pensam que a razão foi superada quando foi somente o conceito de razão que se alterou – se me permitem um trocadilho deleuzeano!

.....Se me gostam ainda, não me queiram como parte disso tudo... Não me embrenhem no óbvio e cotidiano! Não me defendo, aliás, supero e sublimo no exato momento de meu silêncio e olhar no fundo dos olhos! Sigam com seus barcos e me deixem enquanto hasteio minha bandeira negra no meu barco que clama por tempestades e mares revoltos... pois sempre que atraco, atraco em portos de pedras pontiagudas!

..... É assim minha vida e foi assim que eu quis! Se não me entendem é porque não tenho desejo de ser claro. Se lhes incomoda, ora, sejam inteligentes, evitem-me! Corram de mim! Nietzsche já dizia que um filósofo é dinamite pura! Onde se apresenta, tudo fica a um passo de voar pelos ares! Onde um filósofo se manifesta, tudo corre perigo! Onde engessaram uma moral, cuidado! Lá onde acreditam, cuidado! Onde gritam triunfantes tendo isolado um fato ou um dado, querendo mantê-lo para ter uma base sólida, nunca convidem um filósofo para dar uma olhada... Somos corvos da tempestade! Não foi por nada que as labaredas de uma fogueira fizeram Heráclito sorrir com olhos fixos!

..... Mas se desejam mesmo me arrastar para suas festas, para seus cotidianos mesquinhos, mares de vômitos ressentidos, balbucias e fofocas de igreja ou bares, carnavais de acúmulo de citações de livros, reuniões de enaltecimento de um sucesso inventado, bajulações medíocres, comemorações que antes fosse mais útil o silêncio, ataques cardíacos de corações egocêntricos, bocas cheias de confetes e venenos, historietas para bovinos, “piti de mulherzinha”, masturbação generalizada, se desejam mesmo me arrastar para suas festas, sentem-se e esperem esse desejo passar. Pois ao baterem na minha porta ainda terão que responder essa pergunta: Certeza que não se enganou?

..... Cá do meu canto, contemporâneos, não sentirei nenhuma espécie de remorso por estarem redondamente enganados a meu respeito! Não moverei um fio de cabelo para concertar seus equívocos! Os deixarei entregues as suas vergonhas (errar não é vergonhoso, vergonhoso é converter a falta de caráter em moral a fim de suportar-se – o que desemboca em um erro maior). Cá do meu canto, contemporâneos, sei de minha lei. E não se espantem quando o pouco que há de grande no meu espírito sussurrar no meu ouvido “abandone-os” e eu obedecer, pois quando isso acontece, obedeço. Estou ao ponto de muita gente abandonar... pois não posso mais me distrair com causas mesquinhas!

..... Disciplinei-me para a honestidade do que sinto e me comove. Concedi-me um voto de confiança- fiz por merecer-lo-! Rasgo o caos! Estou na filosofia e não entrei pela janela! “Que me importa o resto? O resto é a humanidade!”

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r.A. – Primeira tarde fora de seu subsolo, dia de força, assassinato de qualquer arrependimento!

sábado, 24 de setembro de 2011

Eu não mato para comer, mas se achar morto...





.....É claro que eu disse para aquele filho de uma puta que poderia mexer com minha mulher, mas nunca beber no mesmo copo que eu! Disse isso naquela madrugada, uma terça ou quarta, porque sabia que desta vez havia encontrado uma boa mulher. Boas mulheres possuem um coração que funciona como um diapasão para afinar a vida no ritmo de um velho blues. Ela, é claro, não passa de uma encrenqueira e por isso não se aproximava de mim sem esfregar uma coxa ou um seio – no braço ou na perna. Depois saia trotando “tipo vaca” sem olhar nos meus olhos. Pudera não ter de pagar o preço de minha pose de durão. Mas estava lá, de qualquer forma, escorado em um canto escuro do bar e zona “Sarjeta H.I.V & Cia”, enquanto ela dançava sobre as mesas e outros ridículos (como eu) introduziam-lhe trocados no fio da calcinha. A luz fraca e vermelha brincava com a imaginação e imagem que eu tinha do inferno. São as cadelas que valem à pena, pensei. No mínimo mantêm o amor na periferia da alma! Lá onde todo amor sufoca.
_pensei em tirar a Regina desta zona... – disse Walter. E tragou seu cigarro.
_...quê?
_PENSEI EM TIRAR A REGINA DESTA ZONA! Fazer dela minha mulher!
.....Foi aí que bati meu cigarro no cinzeiro e dei uma gargalhada que me fez cuspir a vodka da minha boca. Eu morava nos fundos de um depósito de cerveja. Um quarto de dois por zero... praticamente dormia em cima de um muro. Vivia o frescor de meu fracasso e me arrastava noites a fio como um lobo velho, sarnento e pulguento. Nas últimas... No entanto era novo.
_do que está rindo Juarez? Perde a noção do perigo, veado de merda? – Walter bate com o copo de cerveja em cima da mesa.
_depois de ter comido sua mãe, suas irmãs e até sua filha, não temo mais mal algum! – retruquei e reguei a goela com vodka.
.....É claro que tinha em mim um certo medo de Walter. Ele era maior que eu, mais gordo e mais feio. Mas estava raivoso naquela madrugada. Nada acontecia nas porcarias dos bares e isso me deixava angustiado. Precisava de uma encrenca para me sentir ocupando um território. Aquelas putas todas que estavam no bar já haviam me rapado os bolsos mais de uma vez. Rapado os bolsos e esvaziado os colhões! Nenhuma valia um pila, exceto ela... que eu devorava com os olhos...
_tem escrito alguma coisa...?- Walter mudando de assunto e se acalmando.
_não. Nem uma maldita linha. – Respondi olhando para o copo vazio.
_eu sabia que um porcaria como você romantizava demais uma vida marginal... agora que vive uma, descobriu que é um lixo de vida e não tem graça alguma...-disse, ergueu o copo como se brindasse e lançou a bituca de seu cigarro por cima de minha cabeça.
.....Não respondi. Não queria pensar sobre aquilo. Só queria pensar em vodka e sexo. Walter se achava grande coisa, mas não passava de um boiola acadêmico. Tinha teoria para tudo. Atacava de psicólogo quando bebia.
_não vai me responder?
_...quê?
_o que falei, ora...
_enche essa boca de cerveja e pare de falar comigo. Com todas essas mulheres rebolando, acha que vou prestar atenção nessas merdas que você tá falando? – Servi meu copo até a borda com a cerveja de Walter. Este acompanhou meu movimento com olhos desaprovadores.
_sabe Juarez... literatura é farsa pura! Seus heróis são de papel e tinta. Até um pescador é mais verdadeiro que Dostoiévski ou Kafka! – Novamente ergueu o copo como se brindasse no ar. Um ar carregado de fumaça de cigarro e cheiro de boceta.
_...não sei... nunca li “Destoiorévski” e Kafka. –Imitei o gesto de Walter. Tentando irritá-lo. Não funcionou nem um pouco.
_e quer ser escritor ainda... – disse e riu.
_não. Quero vodka e sexo. Escritor... Tuft- Cuspi para o lado.
..... Um peito raspou o meu braço direito como a asa de um anjo. Olhei para o lado. Dois peitões, um o caminho para o paraíso, outro o do inferno. E Sabrina me tascou um beijo seco. Mulheres mais velhas... pedagogas do absurdo! Assassinas da inocência do mundo...Porões da torre de babel... “Querido, você vai ficar muito mais tempo por aqui?”. “Meu dinheiro acabou...”. Ela agachou-se como se fosse juntar algo, pegou a grana no fio da calcinha e meteu no bolso de minha jaqueta. “Agora você fica...”. Acenei com a cabeça. Acho que chegou a hora da cerveja! Sabrina saiu, “tipo vaca”. Aquele corpo... Perverso como as fantasias adolescentes! Compota de uma alma mentirosa sabor morango! Coxas tão grandes que mal conseguia equilibrar aquelas pernas no salto alto. Voltou a dançar sobre as mesas e arrecadar dinheiro dos trouxas...
_um homem que tem uma puta por amante não necessita de literatura, Walter!
.....Dei o meu xeque-mate. Walter abriu a boca torta para responder, mas voltou a chupar seu cigarrinho. Éramos, com toda certeza, uns lixos. Machistas que se arrastavam aos pés das mulheres! Por isso pose era tudo que nos restava. As mulheres sabiam disso – antes de nós, inclusive- e por isso não ligavam para nossos pensamentos idiotas. Não sei bem o que viam em nós. O dinheiro, acredito, era um “paliativo”.
.....Três horas depois o bar já estava quase vazio. Até Walter se fora sem proferir mais palavras – para minha grande satisfação. Sabrina passou por mim, agarrou minha mão e me conduziu para um banheiro que possuía a porta lascada. Sem proferir uma palavra encostou os joelhos na tampa do vaso, arredou a calcinha para o lado, virou o rosto de lado e sorriu. A melhor imagem do mês! Meu pênis não endureceu por causa da bebida e por isso simulei um desmaio. Com os olhos fechados senti um coice na costela e ouvi um “veado filho da mãe” antes de pegar no sono. Foi doloroso, acreditem.


r.A.- Para o amigo Luciano, pelo título emprestado.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Das coisas que sei que você precisa e eu não tenho...


.....As boas pessoas são anjos e anjos nascem mortos! Mas você, aparentemente, tem na sua cabeça um retrato de luz... um ideal de paz... uma alma perfeita. Toda vez que encontramos uma pessoa, seja na cama ou na praça, no coração ou no fígado, nos afastamos decididamente de toda glória... enrabamos o divino. E você não quer pagar o preço disso? Frases, frases, frases, palavras, palavras, palavras, e a humanidade com banca de psicóloga virgem que assina o ponto na missa todo domingo, até o fim. E o mundo continua menor que o seu nariz!

.....Não faz mal se você ensaia seu melhor sorriso e a melhor maneira de posicionar a barriga e os seios na frente do espelho... Te juro! É relativo à quantidade de gel que você passa no cabelo para que ele se torne aceitável ao cruzar todas as janelas e refletir nas vitrines da vida. Seria divertido se cortássemos todos os pedaços do corpo e pedíssemos para o cirurgião montar o quebra cabeça de tripas! Também não faz mal se você gasta horas para arrumar o cabelo e faz a maquiagem para dar o cu no fim da noite em um motelzinho de beira de estrada para um cara que só quer contar para os amigos o quanto você é inferior a uma puta. Mas a sua turma saberá onde ir no fim de semana. Mesmo que nada aconteça, estarão orgulhosos por terem sabido onde ir. Não esqueça de perguntar de mim lá no açougue, queridinha de Jesus! Sou o coração do cutelo, humor quadrado de cutelo. Calendário cagado de moscas.

.....Facilmente se esquece o que se tentava provar – Kurt que o diga- e é para isso que existem as agendas e jovens famílias. Com o tempo a gente perde tudo e termina sozinho olhando a parede do hospital. Mas o melhor traficante de pó da região não terá pressa em atendê-lo. Sempre será sua vez, é o que dizem. Mas no lado leste do fim de todos os tempos, você sempre poderá ser um artista pau mandado de um viadinho sem talento! Ou um amigo assombrado pelo fantasma que você criou do seu amigo.

E um dia

Quando você menos esperar

Numa manhã de sol gordinho

Sua mãe entrará para

As estatísticas da funerária sorriso – sua morte é nossa alegria!

Enquanto seu carro te espera na mecânica “Bata já!”

.....Eu sei que não sou legal. Que isso decorre do fato de odiar todos as pessoas legais. E quando saio antes do fim (e no fundo nunca estive lá, aprenda isso) alguém resmunga:_ “que tipinho”... Todavia tinha um sonho. Não foi fácil assistir esse sonho embarcar no trem. Toneladas de mesquinhez humana destilando um estilo de vida a lá Van Gogh me enganaram... Aliás, se Van Gogh ou Nietzsche estivessem vivos hoje, não conseguiriam expor uma tela ou escrever em um blog. Provável que nós o fizéssemos sofrer do mesmo e de outro jeito – pior. Enquanto isso Rimbaud e Bukowski não conseguiriam passar no mestrado em letras “inglês/frances”. Você percebeu que insisto em andar entre as jazidas deste cemitério de gigantes? Pois é.

.....Depois, o que não me tortura e deveria me torturar (?) é o caso de saber “das coisas que você precisa e eu não tenho”. Se houvesse algo em mim que valesse a pena, sentiria muito por não me torturar. Mas não sinto. (Por Deus, não sinto). “Eu sou o enfeite de um jardim que esqueceu de mim”. Das coisas que você precisa e eu não tenho, sou eu. E enquanto você lê isso, sinto no fundo em chamas de todas as minhas células que é tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde demais, tarde de mais, tarde e mais, mais tarde, mais tarde, mais tarde, mais tarde, tarde e tarde, mais e mais, a cada minuto, tarde demais, tarde demais no tardar do tarde demais que é, para falar mais uma vez de amor.

r.A.